São Paulo, sábado, 13 de abril de 1996
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Economista prevê 'descontrole' do déficit

DANIEL BRAMATTI
DE BUENOS AIRES

O economista Miguel Angel Broda, um dos mais influentes na Argentina, disse em uma palestra a empresários que é "inexorável" a ocorrência de problemas na economia brasileira por causa das altas taxas de juros cobradas no país.
Broda teme que o "aumento em espiral" dos gastos do governo para pagar a dívida interna (que cresce alimentada pelos juros) torne "incontrolável" o déficit fiscal.
O economista, adepto da tese do "Brasil-dependência", acompanha de perto a situação do Plano Real. Para ele, problemas no Brasil serão muito mais prejudiciais à Argentina do que a crise mexicana.
"Um efeito caipirinha seria muito mais danoso do que o efeito tequila", afirma.
Para Broda, a solução dos problemas brasileiros passa pelas reformas constitucionais. "Os anos difíceis serão 97 e 98. Tudo vai depender da velocidade com que se fizerem as reformas constitucionais para poder sair do instrumento único de política monetária para baixar a inflação."
A seguir, trechos da entrevista que concedeu ontem à Folha, em Buenos Aires.
*
Folha - Pode acontecer no Brasil algo similar à crise do México?
Miguel Angel Broda - Vemos o perigo brasileiro ao olhá-lo com os olhos da experiência argentina. Uma política de estabilização baseada em política monetária restritiva, com altas taxas de juros, atrai os "capitais andorinha" (capitais voláteis, de curto prazo) do mundo. Dos meus clientes de Nova York, nenhum investe a curto prazo em outro país da América Latina que não seja o Brasil.
Essa entrada de capitais é compensada com o aumento da dívida interna, que duplicou em sete meses. Essa tentativa de esterilizar os movimentos de capitais de curto prazo requer um equilíbrio fiscal que o Brasil não tem.
O problema é que o Brasil se endivida para esterilizar os mercados de capitais, mas também se endivida para financiar o déficit fiscal. Assim, a política de altas taxas de juros, que mantém a inflação sob controle, também retroalimenta os gastos do setor público com juros.
Folha - E quanto isso pode durar?
Broda - Não vejo problemas nos próximos meses. Os anos difíceis serão 97 e 98. Tudo vai depender da velocidade com que se fizerem as reformas constitucionais para poder sair do instrumento único de política monetária para baixar a inflação. A Argentina já usou esse modelo várias vezes, sem êxito. Gastos públicos para cobrir os juros da dívida pública tornam o déficit incontrolável.
Folha - Se o panorama não mudar, o que pode acontecer em 97 ou 98?
Broda - O Brasil está numa corrida em que as mudanças constitucionais têm de ser rápidas. Há eleições em outubro, então até junho se pode fazer algo, e depois todos entram em ritmo eleitoral. O presidente vai querer ser reeleito, e portanto a velocidade das reformas provavelmente não será suficiente para evitar algum susto na macroeconomia de curto prazo.
Folha - Sem juros altos, como conter a inflação?
Broda - Pode-se ajustar a inflação ou com um tipo de câmbio ou com política monetária. Se o ajuste é com política monetária, isso dá tempo para que se ajuste a política fiscal. Mas se isso não acontece, o modelo é inconsistente a longo prazo. E algum aumento do risco brasileiro vai haver. O grande problema é que para ajustar a política fiscal o governo precisa fazer mais gastos. Como o que necessitou para que o Congresso aprovasse a reforma da Previdência e para que não saísse a CPI do sistema financeiro.
Folha - Ainda há risco de agravamento da crise bancária?
Broda - Há, mas muito menor do que o problema mexicano. O Proer já gastou US$ 5,9 bilhões, e vários outros bancos terão dificuldades.
O governo terá de continuar aumentando os gastos públicos para sanar os bancos em dificuldades. Mas não vejo risco como o do México, porque os grandes bancos estão muito capitalizados.
Folha - Como o sr. vê a polêmica provocada pelas declarações do economista Rudiger Dornbusch, de que o Brasil deveria se preocupar em crescer, mesmo com aumento da inflação?
Broda - Dornbusch disse um monte de bobagens. Não se pode transformar uma economia se as taxas de inflação não caem duramente.
Dornbusch atacou o êxito do plano, que é a taxa de inflação declinante. O ponto que ele atacou é o único salvável desse plano.

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