São Paulo, sábado, 13 de abril de 1996
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Leia a íntegra da liminar

Mandado de segurança nº 22.503-3 Distrito Federal
Impetrantes: Jandira Feghali e outros (Adv.: Paulo Machado Magalhães). Impetrado: Presidente da Mesa da Câmara dos Deputados
Decisão - liminar
1. Os deputados federais Jandira Feghali (PC do B-RJ), Sérgio Miranda (PC do B-MG), Matheus José Schmidt Filho (PDT-RS), Sandra Meira Starling (PT-MG), Alexandre Aguiar Cardoso (PSB-RG), Agnelo Santos Queiroz Filho (PC do B-DF), Aldo Silva Arantes (PC do B-GO), Eduardo Jorge Martins Alves Sobrinho (PT-SP), Haroldo Borges Rodrigues Lima (PC do B-BA), Humberto Sérgio Costa Lima (PT-PE), Inácio Francisco de Assis Nunes Arruda (PC do B-CE), José Aldo Rebele Figueiredo (PC do B-SP), Luiz Lindbergh Farias Filho (PC do B-RJ), Maria do Socorro Gomes Rodrigues (PC do B-PA), Miro Teixeira (PDT-RJ) e Ricardo Krachineski Gomyde (PC do B-PR) impetram este mandado de segurança contra ato do presidente da Mesa da Câmara dos Deputados -deputado Luís Eduardo Magalhães- formulando pedido de concessão de liminar.
Após discorrerem sobre os precedentes desta Corte, relativos a mandados de segurança impetrados contra ato do Poder Legislativo e dizerem da singularidade do caso, a afastar a óptica de que a hipótese estaria a revelar o envolvimento de matéria interna corporis, sustentam que o ato impugnado discrepa, considerado o processo legislativo, do disposto nos artigos 43, parágrafo único, 118, parágrafo 3º, 163, inciso VI, e tende em vista a prejudicialidade de emenda constitucional, da regra da alínea "r" do inciso I do artigo 17, todos do Regimento Interno da Câmara dos Deputados.
Em síntese, afirma-se que o substitutivo do relator da proposta de emenda constitucional nº 33-A, de 1995, originária do Poder Executivo, versando sobre o sistema de Previdência Social e estabelecendo normas de transição e outras providências, deputado Euler Ribeiro, designado pela Mesa da Câmara em substituição à Comissão Especial, foi rejeitado pelo plenário, em votação ocorrida no dia 6 de março último, vindo a ser designado novo Relator da matéria o deputado Michel Temer. Todavia, segundo as razões desta impetração, o citado relator declarara a autoria da emenda aglutinativa nº 6, assim se expressando ao responder ao deputado José Genoino:
"Sr. Presidente, sras. e srs. deputados, em primeiro lugar, vou tomar a liberdade de registrar que a emenda aglutinativa -e transparentemente está dito no regimento- busca aglutinar emendas para alcançar o objetivo proposto por várias emendas. Esse é o primeiro ponto.
O segundo ponto é saber se há ou não impedimento de algo escrito à mão na emenda aglutinativa.
Outro ponto que antecipa essa preocupação é saber se aquele que hoje é o relator pode ou não participar das conversações a respeito da elaboração da emenda aglutinativa. Não vamos enganar uns aos outros. É claro que participei ativamente, que discuti e que ajudei a redigir esta proposta...
O sr. José Genoino - Vossa Excelência é o autor!
O sr. Michel Temer - Não tenham a menor dúvida.
Como muitos deputados, estou assumindo isso, honestamente, como não poderia deixar de ser. Muitos parlamentares participaram do debate desse tema. Quando vim relatar, conhecia a matéria, não vim com desconhecimento dela. Foi nos últimos instantes, diante da Mesa, que os líderes e nós, por força da exclusão de um dispositivo que deveria constar do projeto, acrescentamos o que aqui vou ler para aqueles que solicitaram:
"Artigo 6º - Não se aplica a vedação prevista no artigo 37, parágrafo 7º, aos servidores inativos, civis e militares, que até a promulgação desta emenda tenham reingressado no serviço público por concurso público de provas e títulos bem como aos integrantes do Poder Judiciário que nele ingressaram pelo quinto constitucional" (folhas 13 a 15)
Aponta-se que, sob tal ângulo, o vício estaria consubstanciado na coincidência entre a autoria e a relatoria da emenda.
Em um segundo passo, aduz-se que a emenda aglutinativa nº 6 acabou por incluir dispositivos do substitutivo rejeitado, citando-se o inciso XII do artigo 7º, os parágrafos 2º a 6º do artigo 40, o parágrafo 3º do artigo 73, o parágrafo 3º do artigo 114, o parágrafo 4º do artigo 129, os incisos I e II e parágrafos 9º e 10 do artigo 195, o artigo 201 e parágrafos e os parágrafos 1º e 2º do artigo 202. Alude-se, mais, ao fato de não ter ocorrido a indicação das emendas aglutinadas concernentes à transação visando à aproximação dos respectivos objetos. Daí por que a inovação de proposições estaria a exsurgir, na espécie, como prática vedada, vez que não permitida na lei de regência do processo legislativo. Novas proposições teriam sido inseridas ao arrepio da ordem jurídico-constitucional. Quanto à inclusão de dispositivos do substitutivo rejeitado, evoca-se a norma do inciso VI do artigo 163 do Regimento Interno da Câmara.
Com a inicial, vieram os documentos de folhas 25 a 306.
2. Inicialmente, consigno que a hipótese está distanciada do campo relativo aos atos interna corporis. Em discussão não se fazem assuntos ligados à economia interna da Câmara dos Deputados, nem procedimento circunscrito ao âmbito da conveniência política, da discricionariedade. Evoca-se, na inicial deste mandado de segurança, o desprezo ao processo legislativo, que possui regência de estatura constitucional, sendo marcante os preceitos insculpidos nos artigos 59 a 69 da Carta Política da República. A expressão "processo legislativo" é conducente a presumir-se a organicidade e esta é balizada pelas normas em vigor. Com inegável valia, visando à almejada segurança jurídica e, também, à participação parlamentar dos representantes do povo, quer formando em correntes políticas majoritárias, quer em minoritárias, tem-se não só a disciplina decorrente do regimento interno da própria Casa Legislativa, como também a constitucional, estabelecendo regras e princípios a serem obrigatoriamente observados. No caso dos autos, repita-se, discute-se não o mérito do que contido em proposta de emenda constitucional, a conveniência e oportunidade de estabelecer-se certo regramento, mas sim a tramitação daquela. O que versado na inicial reveste-se de inegável relevância jurídica. O parágrafo 5º do artigo 60 da Constituição Federal preceitua que "a matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa". Entrementes, na emenda aglutinativa teriam sido inseridos dispositivos constantes do substitutivo, alvo de recusa, do relator da proposta da emenda constitucional nº 033-A de 1995, do Poder Executivo. A par desse aspecto, em face ao sentido vernacular da expressão e, mais do que isso, ao Regimento Interno da Câmara dos Deputados, a emenda aglutinativa pressupõe a mesclagem, em si, de emendas apresentadas, sendo indispensável que haja ao esclarecimento acerca da existência e extensão do conteúdo destas últimas, o que não teria ocorrido, de forma completa, na espécie. A consideração de matérias estranhas às citadas emendas objeto de aglutinação destoa, ao primeiro exame, do texto do artigo 122 do regimento interno da Casa, implicando ilegítima inovação. Constata-se, mais, a inobservância do teor do artigo 43, parágrafo único, daquele regimento interno. O relator da emenda aglutinativa, com a honestidade intelectual que o credencia no mundo jurídico, confessou, em plenário, a autoria da proposta, dizendo ainda que, sobre o fato, não deveria pairar qualquer dúvida. À primeira vista, o que transparece é o desrespeito ao devido processo legislativo tal como definido na Constituição Federal e no regimento interno da Câmara dos Deputados.
Tenho como atendido o primeiro pressuposto alusivo à liminar, ou seja, a relevância da questão. Quanto ao risco de manter-se com plena eficácia o quadro até aqui notado, decorre de encontrar-se em tramitação o processo legislativo relacionado à citada proposta.
3. Pelas razões supra, presente a guarda da ordem jurídico-constitucional atribuída ao Supremo Tribunal Federal, concedo a liminar pleiteada a fim de que a Câmara dos Deputados, até o julgamento final deste mandado de segurança, abstenha-se da prática de qualquer ato concernente à tramitação da proposta de emenda constitucional 33-A/95.
4. Solicitem-se informações à autoridade apontada como coatora. Vendo estas, proceda-se à remessa dos autos ao Procurador Geral da República.
5. Publique-se.

Brasília, 12 de abril de 1996.
Ministro Marco Aurélio

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