São Paulo, domingo, 14 de abril de 1996
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Montana faz humor com nova celebridade

DO "USA TODAY"

A Phelps Dodge Mining Co. está se propondo a construir uma enorme mina de ouro a céu aberto perto de Lincoln, a 12 km da cabana de Kaczynski. A questão vem dominando a imprensa local e opõe os defensores do meio ambiente aos desenvolvimentistas.
Longe das montanhas de Montana, alguns comediantes não demoraram a captar o fascínio mórbido que o público sente por Kaczynski. Um dia depois de sua prisão, David Letterman disse aos espectadores que se Kaczynski fosse julgado na Califórnia, "em seis meses estaria jogando golfe com O.J. (Simpson)".
Em Helena, a Montana Marketing Inc. começou a vender camisetas com referências ao Unabomber e está pensando em produzir os óculos de sol Unabomber, além de canetas e lápis no formato de bombas.
Mesmo entre aqueles que não brincam com o assunto, o tom muitas vezes não é de condenação.
"Pobre infeliz. É um sujeito estranho", diz Nancy Kosenka, gerente de uma livraria em Berkeley. Outro livreiro de Berkeley, Moe Moskowitz, quer saber "por que a mídia está retratando esse cara como um vilão. No gueto há gente que mata o dobro de pessoas e não recebe metade dessa notoriedade. Acho que o poder se sente ameaçado por ele".
"Ele é um Robin Hood high-tech", diz Jack Levin, escritor e professor de sociologia na Northeastern University. "Muitos americanos sentem exatamente o mesmo que ele em relação à tecnologia, às grandes empresas, à intromissão do governo na vida das pessoas, às demissões, fusões, consolidações. São pessoas que não chegam a matar, mas sentem muita raiva. Para elas, o Unabomber talvez pareça um herói."
Levin diz que muitas pessoas também glorificaram Bernard Goetz, que matou quatro adolescentes negros num trem do metrô nova-iorquino em 1984. Ele ficou conhecido como o "Justiceiro do Metrô", porque os rapazes haviam exigido US$ 5 dele.
Saudado por muitos nova-iorquinos fartos da criminalidade, Goetz foi absolvido de agressão e tentativa de assassinato, mas cumpriu pena de oito meses por posse ilegal de arma.
Ele acabou sendo considerado "ídolo do ativismo", diz Levin. "Em nossa busca por heróis, acabamos transformando monstros em heróis."
O público temia o Unabomber desconhecido. Mas, "agora que está preso, as pessoas podem gostar dele", acrescenta Levin. "Fizemos a mesma coisa com Ted Bundy" -o estudante de direito que virou "serial killer", executado na Flórida em 1989.
Será que esse fascínio com o mórbido revela alguma coisa sinistra na cultura norte-americana? Levin acha que não. Em sua opinião, a maioria dos americanos recorre "aos crimes grotescos ou extraordinários como válvula de escape de seus problemas do dia-a-dia... É como se esses assassinos estivessem no cinema, e o fascínio não é mórbido. Na realidade é benigno".
Em Lincoln, Montana, Kaczynski era visto como um vizinho tranquilo. "Só posso julgá-lo pela maneira como ele me tratava", diz a bibliotecária Beverly Coleman, que atendia seus pedidos de livros, "e sempre foi muito agradável".
"Só posso sentir pena dele", diz Betty Butler, uma vizinha. "Ele não passa de uma alma perdida."

Tradução de Clara Allain

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