São Paulo, domingo, 21 de abril de 1996
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Novo Tchernobil ameaça Leste Europeu

IGOR GIELOW
DE LONDRES

Dez anos depois do maior desastre nuclear da história, os países europeus ainda estão sob ameaça de novos acidentes com reatores obsoletos construídos pela antiga União Soviética.
A avaliação está em relatório do IIEE (Instituto Internacional de Estudos Estratégicos) obtido com exclusividade pela Folha.
A explosão do reator 4 da usina de Tchernobil, na norte da Ucrânia, completa uma década na sexta-feira.
Morreram no acidente mais de 110 pessoas, mas o número é impreciso e pode chegar a 200 mil se o cálculo incluir os atingidos pelos efeitos da radiação liberada no acidente.
Reatores
Desde então, países e organizações ocidentais tentam evitar novas catástrofes melhorando a segurança dos reatores. Mas hoje há quatro modelos iguais ao de Tchernobil sendo construídos em Kursk, na Rússia.
O IIEE, instituição mais conceituada em política estratégica no mundo, lista 80 reatores de modelo soviético em funcionamento na Rússia, repúblicas centro-asiáticas e em ex-satélites no Leste Europeu.
Destes, 15 pertencem ao grupo de altíssimo risco -os chamados modelos RBMK, que usam torres de grafite para resfriar o processo nuclear no reator.
Esses modelos são iguais aos de Tchernobil, complexo que ainda mantém dois reatores RBMK funcionando.
Proximidade
Além disso, funcionam 15 reatores do tipo VVER, que usam água para resfriar o núcleo, construídos na década de 60.
"Esses reatores, apesar de melhoramentos, são muito perigosos", diz o pesquisador John Baker, que trabalha no IIEE.
Segundo documento da Aien (Agência Internacional de Energia Nuclear) do final do ano passado, os reatores restantes "se aproximam do padrão ocidental de qualidade, mas a manutenção deficiente eleva o potencial de risco".
A agência, com sede em Genebra, pediu oficialmente o fechamento das usinas do tipo RBMK e dos modelos antigos VVER há dois anos.
Para a União Européia, a preocupação é grande porque há outros reatores VVER em funcionamento na República Tcheca, Eslováquia, Hungria e Bulgária.
Risco
"Nós entendemos que existe um grande risco de acidente, mas nada comparável à explosão de dez anos atrás", disse à Folha Remy Carle, presidente da Associação Mundial de Operadores Nucleares, entidade que reúne 126 chefes de usinas nucleares do mundo todo.
O risco maior é de um vazamento, em caso de perda de pressão nas tubulações de resfriamento, de material contaminado pela radiação. A exposição de um núcleo derretido de reator, como aconteceu em Tchernobil, é considerada "improvável" pela Aien.
Segundo a sede londrina do grupo ambientalista Greenpeace, que defende o fechamento dos reatores, um dos maiores problemas é justamente o que fazer com o material das usinas desativadas.
No caso do reator 4 de Tchernobil, cuja tampa superior foi jogada para o ar com a explosão, foi construído um "sarcófago" de chumbo para lacrar o local. Dez anos depois, diz o Greenpeace, rachaduras ameaçam permitir o vazamento do material radioativo.
Ucrânia e Rússia tinham um plano para fechar definitivamente o complexo de Tchernobil.
Os ucranianos só aceitam o fechamento se os russos pagarem US$ 3 bilhões em indenização. Dizem que foram engenheiros sob ordens de Moscou que projetaram o local. A Rússia rejeita a tese.
O problema, assim como o das outras "bombas-relógio" do antigo bloco soviético, se arrasta sem perspectiva de solução -ou até um novo desastre.

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