São Paulo, segunda-feira, 22 de abril de 1996
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Retirada de tropas israelenses assusta o Hizbollah

IGOR GIELOW
DO ENVIADO ESPECIAL

Uma eventual retirada de Israel do sul do Líbano assusta o Hizbollah e, provavelmente, não é a intenção do grupo, apesar da retórica de seus líderes e da crescente identificação com a política partidária e com o assistencialismo.
O governo libanês emite o seguinte sinal ao Ocidente: não pode fazer nada com o Hizbollah enquanto os israelenses estiverem no sul. O "enquanto" não é apenas uma questão semântica.
Com cerca de 3.000 guerrilheiros, o Partido de Deus teme a posição do governo libanês em uma eventual retirada de Israel.
O Exército libanês tem 36 mil homens e está se reequipando. Se a Síria, que, com o Irã, hoje é o pilar do Hizbollah fora do Líbano, resolver deixar o apoio à guerrilha de lado em um acordo com Israel, é possível que Líbano mergulhe em outra guerra civil.
Na visão de diplomatas ouvidos pela Folha em Beirute, o Hizbollah poderia ser desmantelado nesse conflito.
A principal arma dos guerrilheiros fundamentalistas é o antigo foguete russo Katiucha, desenhado na extinta União Soviética em 1950 e fabricado até hoje.
Ele chega ao guerrilheiros do Hizbollah vindo do Irã por meio de rotas na Síria. Se houver uma decisão de cortar as vias sírias, os Katiucha vão acabar, e o Hizbollah pode ser esmagado.
Política
"Hoje o Hizbollah vive o mesmo dilema que Iasser Arafat (presidente da Autoridade Nacional Palestina). Sabe que, no espectro político libanês, terá de se legitimar como força democrática para sobreviver", disse um diplomata.
Hoje, o Hizbollah tem 12 deputados em uma Assembléia Nacional de 128 membros. Um dos líderes de seu restrito conselho político, o parlamentar Nauaf Massaui, disse à Folha que hoje não há como negar a aglutinação de forças em torno do grupo.
"Depois do massacre de Qana (ataque da artilharia israelense contra uma base da ONU que abrigava refugiados, que matou 101 civis libaneses), o patriarca maronita pediu apoio à resistência", disse Massaui, referindo-se a um dos inimigos históricos do Hizbollah.
O trabalho comunitário do Hizbollah também é peça de marketing. O partido reconstruiu cerca de 600 casas destruídas por ataques israelenses no ano passado.
A distribuição de colchões aos milhares de refugiados que deixaram o sul do Líbano após o início dos ataques de Israel e partiram para áreas árabes de Beirute é feita por militantes do Hizbollah.
Síria
Embora hoje pareça confortável, a posição síria é delicada. Israel e Turquia firmaram um acordo militar neste ano.
Nos meio diplomáticos de Beirute, circula a informação que houve uma ação conjunta entre os países contra os guerrilheiros do PKK (Partido dos Trabalhadores do Curdistão) no sudeste turco no início deste mês.
Isso pode gerar um fluxo de refugiados curdos no norte sírio, mais um problema para o presidente Hafez al Assad -especialmente se eles se unirem aos curdos do norte do Iraque por independência.
A economia da Síria, essencialmente agrária, também precisa de reformas. Há pressão sobre o grupo governante -os muçulmanos anauitas, que dominam demograficamente apenas o norte do país- por uma maior abertura dos mercados.
EUA
E há os Estados Unidos. Em entrevista coletiva ontem em Jerusalém, o premiê israelense, Shimon Peres, afirmou: "Os EUA carregam mais experiência, desde Camp David, para solução de questões no Oriente Médio. Eles serão o único canal para acordos".
Camp David, nos EUA, sediou em 1979 o primeiro acordo de paz entre um país árabe -o Egito- e Israel.
A posição desagrada Hizbollah, Síria e Irã. O Líbano, por sua vez, gostaria de um acordo orquestrado pelo antigo parceiro, a França.
Os sírios prefeririam a mão russa do chanceler Primakov atuando. Ele chegou ontem a Beirute, mas tem pouca margem de manobra pela falta de acesso aos israelenses.
"Todos são bem-vindos para conversar. Mas o acordo é assunto dos EUA", disse Peres ontem em Jerusalém.
(IG)

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