São Paulo, quinta-feira, 25 de abril de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Visão "destorcida"

BRUNO FEDER

Em artigo publicado neste espaço, em 20 de março, a vereadora Aldaíza Sposati cobra da Prefeitura de São Paulo o assentamento dos desabrigados das enchentes em apartamentos do projeto Cingapura. Em primeiro lugar, devo congratular-me com minha nobre colega do PT: finalmente seu partido dá mostras de abandonar o sectarismo extremado e se render às evidências de que o projeto de verticalização de favelas do prefeito Paulo Maluf vem preencher uma lacuna e dar aos desassistidos condições de vida e moradia dignas.
Entretanto, para não perder o hábito, Aldaíza Sposati distorce os fatos na questão das enchentes. Ela diz que "historicamente" ocorre nesses casos um "desentendimento" entre as secretarias municipais da Habitação, Bem-Estar Social e das Administrações Regionais. A verdade é que esse desentendimento não é "histórico" e sim fez parte da triste história da gestão petista em nossa cidade.
A irresponsabilidade desse período, quando Erundina era prefeita e Aldaíza Sposati respondia pela Secretaria das Administrações Regionais, ficou marcada na memória da cidade por meio do soterramento de 32 barracos da favela Nova República, que matou 15 crianças e três adultos.
Segundo a reportagem da Folha (26/10/89), o perigo foi comunicado pela Secretaria da Habitação, que constatara previamente um pequeno deslizamento, à Secretaria das Administrações Regionais. Nenhuma providência foi tomada para remover os moradores, sobre cujas cabeças caíram 300 mil toneladas de terra, que "caberiam em 30 mil caminhões basculantes", segundo cálculos da reportagem.
O trecho mais estarrecedor da reportagem é o seguinte: "A sobrevivente Maria Neusa Soares, 30, disse que há cinco dias telefonou para a Administração Regional do Butantã para alertar a socióloga Marisa Campacci do risco. Do outro lado da linha alguém comentou: 'É aquele pessoal da favela enchendo o saco de novo'".
Como nada disso ocorreu na atual gestão, apesar de as chuvas deste ano terem sido as maiores das últimas décadas, a vereadora Sposati não encontra outro remédio para aplacar sua consciência culpada do que criticar as condições de um abrigo da prefeitura na Vila Maria, que tem quartos individuais e chaves entregues aos moradores, num prédio dedetizado e desratizado e entregue com banheiros completos, com instalações hidráulica e elétrica perfeitas. Ainda assim, apenas um abrigo provisório, pois seus atuais ocupantes serão transferidos.
Em resumo, a prefeitura de Paulo Maluf vê, vem e faz, enquanto o desgoverno do PT assistiu ao soterramento desses favelados que "enchem o saco".

Texto Anterior: Engarrafamento e paixão
Próximo Texto: Ladrões furam bloqueio da PM, trocam tiros e ferem 2
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.