São Paulo, domingo, 28 de abril de 1996
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Mulher compra sapato, lápis e 'osso com restinho de carne'

JOÃO BATISTA NATALI
DO ENVIADO ESPECIAL

Boa Esperança é o nome irônico de uma das 19 favelas de Ribeirão Preto. Ana Correia Colete, 46, é moradora no barraco nº 13. Ela, uma neta e cinco filhos.
Sua pobreza poderia ser maior. O programa municipal de renda mínima lhe dá R$ 100,00 por mês, e com isso ela compra comida, "um sapatinho para a menina, caderno e lápis para o menino, e uns ossos de frango com um restinho de carne, para misturar no feijão".
Ana nasceu em Morro Agudo (380 km a norte de São Paulo). Sempre trabalhou na roça. "Abanei café, capinei algodão e cortei cana." Foi mãe 14 vezes. Quatro de seus filhos morreram.
Perdeu uma vista "de meningite" e tem câncer de pele. Não pode trabalhar. O filho mais velho, de 34 anos, "vive de comprimido" e é seu dependente parte do tempo.
Dois barracos acima, no nº 13, mora Maria Aparecida Patrício da Silva, 30, mãe de sete filhos -o mais velho tem 11 anos- e catadora de sucata.
Ela entrou no programa de renda mínima pela porta principal. No Natal de 95, um de seus filhos foi recolhido por uma assistente social enquanto pedia esmola numa esquina da cidade.
Para ter a criança de volta, comprometeu-se a matriculá-la na escola e seguir orientações sobre higiene e nutrição que seriam dadas com o dinheiro.
Maria Aparecida acabou de pagar um cavalo, que permitiu carregar mais peso em sua carrocinha, comprou um poste de luz para ser conectada à rede elétrica e agora gasta integralmente os R$ 100,00 com as crianças.
"Comida eu ganho com sucata. Eu e meu companheiro, Durvalino", pai dos filhos menores.
Ana e Maria estarão em breve de mudança. Vão morar num conjunto habitacional que a prefeitura está construindo para tirá-las de um terreno que será cortado por uma avenida.
A 212 km mais ao sul, em Campinas, Marlene Alves Pereira da Silva, 30, é moradora de um loteamento com barracos esparsos, chamado Vida Nova.
Ela já chegou aos oito filhos. O mais velho tem 13 anos e o menor um ano e meio.
"Esses anos foram difíceis, sem dinheiro para comida e com as crianças doentes", lamenta. Um dos meninos pedia esmola na rua. Agora, vai à escola.
Comprou um poste de luz e geladeira, uma televisão velha e tem conseguido trazer mais comida para casa. Seu plano, agora, é equipar o quarto de seu barraco de dois cômodos com beliche para as crianças.
A 7 km dali, Marinaldo da Cruz Pardo não é um beneficiário direto do programa de renda mínima, mas sente seus efeitos no pequeno comércio de refrigerantes, secos e molhados.
"Começou a melhorar com o Real. Antes eles vinham comprar um sabão. Hoje já compram feijão, óleo e sal", diz ele, que calcula ter aumentado seu movimento, junto a uma favela ao norte da cidade, em 15%.
(JBN)

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