São Paulo, domingo, 28 de abril de 1996
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Governo FHC dá prêmio à sonegação

ALOYSIO BIONDI

Os grandes devedores de impostos federais voltaram a ser presenteados pelo governo FHC: vão poder pagá-los em 72 meses, isto é, seis anos.
Em menos de dois anos, por incrível que pareça, é a quarta vez que se adia o ingresso de bilhões de reais nos cofres da União -ao mesmo tempo em que, contraditoriamente, o governo insiste em "reformas para salvar o Estado".
A nova anistia é tão ampla que inclui os impostos devidos e não pagos até nada menos do que o último dia de 1995.
Anteriormente, o presidente FHC já havia autorizado o parcelamento em 1994, ainda como ministro. Foram nada menos de 84 meses, ou sete anos de prazo. Depois, veio uma anistia de 24 meses. Em seguida, no começo do ano passado, novo perdão, com 60 meses para pagar débitos ocorridos até junho...
Na prática, isto significa que grandes empresas e contribuintes estão sendo estimulados a sonegar, não pagar, pois têm certeza de que sempre haverá nova "anistia" -exatamente como o empresário Antonio Ermírio de Moraes observava há dias em sua coluna nesta Folha.
Não apenas os devedores de impostos têm sido beneficiados: débitos com INSS e FGTS estão, outra vez, sendo parcelados.
Qualquer criança é capaz de aperceber-se de que a tão falada crise dos governos da União e Estados no Brasil é falsa, criada pelas próprias equipes econômicas para justificar aberrações como a privatização e venda de estatais a toque de caixa.
O governo alega falta de recursos, parte para a demissão de funcionários e a redução de serviços públicos -num país onde eles praticamente já não existem. A alternativa correta seria o governo aparelhar-se inclusive para arrecadar o que lhe é devido, evitar a sonegação. Mas, o que se pode esperar de governantes que abrem mão, adiam a toda hora o pagamento até do imposto que o contribuinte já declarou?
Vantagens
O parcelamento de impostos devidos tem sido acompanhado do perdão de multas, e, vantagem maior, cobrança de juros de apenas 1% ao mês. Os anistiados levam imensa vantagem sobre seus concorrentes, as empresas que pagam em dia.
Mentiras
Pode-se alegar que o parcelamento é necessário diante da má situação de empresas atingidas pela recessão. Lérias. No começo de 1995, as empresas nadavam em dinheiro graças às grandes vendas do Real, no segundo semestre de 1994. Hora ideal para o governo receber impostos. Pois a equipe FHC concedeu outro parcelamento. É a rotina antipovo.
Ideal
Agora, com a recessão, há setores e empresas com problemas. As regras do parcelamento deveriam atender a esses casos. Critério equitativo, já adotado pelo ex-ministro Marcílio: as parcelas seriam um percentual, por exemplo, do faturamento médio dos últimos três anos. Quando a economia reagisse, e o setor melhorasse, as prestações cresceriam automaticamente, e o prazo seria menor.
Sob suspeita
Meses atrás, portaria do Ministério da Fazenda trouxe perigosa inovação: quando a Receita Federal não desse resposta a um pedido de parcelamento em 90 dias, ele seria considerado "automaticamente concedido". Isto é: se alguém engavetar o processo, por ordens superiores ou não, o privilégio será dado. E ninguém poderá ser responsabilizado, amanhã.
O novo parcelamento de impostos foi oficializado por MP. Autoritariamente. Quando o Congresso vai desenterrar o projeto que limita o uso desses recursos pelo governo?

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