São Paulo, domingo, 28 de abril de 1996
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Banerj, um modelo e um exemplo

MARCO AURÉLIO ALENCAR

Bastaram três meses. Bastou esse curto período de gestão privada, e terceirizada, no Banerj para que esse novo modelo de reestruturação financeira, criado pelo Estado do Rio de Janeiro, se tornasse uma referência nacional. E mesmo internacional: já é apontado até no exterior como um exemplo de inovação.
A criação desse modelo nada teve de complexo. Teve apenas a audácia das coisas simples; das soluções que vão à raiz dos problemas. Resultou, assim, de dois fatores: coragem e vontade política.
De início, invertemos as etapas. Começamos profissionalizando a gestão; reduzindo custos e gastos; promovendo um processo completo de reestruturação. Com essas medidas, recolocamos o Banerj nos trilhos.
Só mais tarde, já no âmbito do processo de privatização, é que entraremos na segunda etapa: aí é que iremos procurar o governo federal para renegociar dívidas, pleitear créditos de longo prazo com recursos do Proer, fazer a reordenação patrimonial. Ou seja: cuidou-se, primeiro, dos problemas operacionais; só depois se cuidará da questão institucional.
Até agora, ninguém fez isso. A despeito da crise bancária que vem pondo a nu a fragilidade do sistema financeiro brasileiro, golpeando agora também as instituições privadas que se cevavam com os lucros inflacionários -aquilo não era músculo, mas mera gordura-, muitos políticos e governadores vêm insistindo nas soluções velhas, ultrapassadas, do puro socorro oficial para salvar gestões ruinosas -soluções, como sempre, de alto custo para o cidadão, a quem caberá pagar a conta.
Em geral, os outros bancos estaduais vêm tentando resolver seus problemas começando pelo lado institucional. É o caso, por exemplo, do Banespa. Em vez de fazer a reestruturação do banco, São Paulo começou tentando a transferência para o Tesouro Nacional de parte de sua dívida junto ao Banespa.
O problema dessa estratégia é que, se há algum atraso no processo, como entraves no Congresso, isso gera novos problemas; a dívida continua crescendo, e isso exige novas e sucessivas negociações, cada vez mais intrincadas e onerosas.
Este problema não aflige apenas o Banespa, e não está confinado às nossas fronteiras. Recentemente, consultores argentinos diziam-me que, lá, a tentativa de privatização dos bancos provinciais vem enfrentando grandes embaraços porque o processo não foi precedido de programas de ajustes prévios, mudanças de gestão e reestruturação.
Com o advento do Plano Real e a sua consequência -a estabilização econômica-, a tipificação tradicionalmente empregada para distinguir as instituições bancárias -controle do capital votante, controle público, privado ou estrangeiro- deixou de ser relevante. Foi substituída por uma nova, que distingue os bancos a partir de suas características de gestão: bancos bem ou mal administrados; bancos de gestão profissional ou corporativista; bancos competitivos ou não-competitivos.
Atento a essa mudança, o Rio de Janeiro logo percebeu por onde começar o processo de saneamento dos bancos estaduais, em sua quase totalidade enquadrados como instituições não-competitivas e de gestão corporativista: pela profissionalização da gestão.
Isso vem provocando, em tão pouco tempo, mudanças radicais na forma de atuação do Banerj, agora recolocado na realidade do mercado. Uma política firme de cobrança está recuperando créditos, com o combate decidido à "cultura da inadimplência", peculiar à maioria dos bancos públicos brasileiros -credores lenientes na cobrança, devedores certos de que jamais serão cobrados.
Todas essas mudanças já resultaram em um grande ganho para o país: o Banerj saiu do rol dos grandes problemas financeiros, já não é mais motivo de desassossego para o Banco Central.
O próprio Congresso Nacional já vem tendo essa percepção. Na recente convocação do ministro Pedro Malan para esclarecimentos, o Congresso nada inquiriu sobre o Banerj. Aliás, há poucos dias, ao falar sobre o processo de reestruturação do sistema financeiro, o ministro Malan disse que esse processo não parou e que haverá ainda outras fusões e incorporações, não só no setor privado.
E acrescentou: "Qualquer banco estadual que quiser seguir o modelo do Banerj terá o nosso apoio". Eis o modelo do Banerj consagrado pela maior autoridade econômica do país como um símbolo, um emblema, um exemplo. Exemplo de audácia e pioneirismo; não seria exagero dizer que o modelo de reestruturação e privatização do Banerj foi o mais importante fato relevante ocorrido no sistema bancário brasileiro nos últimos dois anos.
Atualmente, o Banerj é o único banco público do Brasil -e do mundo- com gestão absolutamente privada.
Esse modelo é, também, um exemplo porque não se contentará com o êxito do processo de saneamento financeiro. Cumprida essa etapa, sua meta final será a transformação do antigo banco estatal paquidérmico e ineficiente em uma instituição competitiva, voltada para o interesse público e indutora do desenvolvimento e do crescimento econômico do Estado do Rio de Janeiro.

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