São Paulo, segunda-feira, 29 de abril de 1996
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O poder é uma festa

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Nos tempos de Collor, a mídia reclamava do estilo brega que o poder de então adotara e no qual se deslumbrara. Era uma corte provinciana cuja festa gravitava em torno de um casal de novos-ricos, mais preocupado com a grife das malas de viagem do que com a própria viagem.
Na corte atual, a festa é mais abrangente, um pouco no estilo dos anos 70. Todos têm de se reunir para dar a impressão de que estão vivos e fazendo alguma coisa.
Os terceiros escalões realmente pegam no pesado, despacham, analisam e, quando é o caso, executam alguma coisa. O segundo escalão conspira e dá expediente integral na dura faina de informar e ser informado, pois está a serviço primeiramente do titular mais imediato, em segundo lugar, da inesperada brecha, do hiato que pode transformar uma segunda autoridade em primeira.
Os titulares, sem a obrigação de pegar no pesado, de conspirar e aguardar brechas, consomem dias, semanas e meses na estafante maratona de reuniões, jantares, almoços, viagens, cafés da manhã -roteiro vertiginoso que não dá tempo de sentar o traseiro na tal cadeira para a qual fizeram tanta força e deram tanto vexame para serem nomeados ou eleitos.
Houve o caso do ministro que, um ano depois da posse, entrou num gabinete errado, ocupou a mesa que julgava ser a sua, só desconfiou de que alguma coisa estava estranha por causa de um porta-retrato com duas robustas crianças deitadas num gramado que não era o seu. Na verdade, nem o gramado, nem as crianças, nem a mesa, nem o escritório eram seus, mas de um diretor do seu ministério.
A semana que passou foi esbofante para esse tipo de poder. Como se não bastassem as fofocas da mudança de alguns ministros, houve o aniversário do presidente do Senado.
Vi algumas fotos do grandioso evento. É impossível imaginar que essa gente tem tempo e vontade de pensar no Brasil.

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