São Paulo, segunda-feira, 29 de abril de 1996
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Pressão legítima e indispensável

CARLOS EDUARDO MOREIRA FERREIRA

Trabalhadores e empresários da indústria decidiram unir esforços para pressionar democraticamente o Executivo e o Congresso no sentido de que sejam realizadas as reformas da Constituição reclamadas por toda a sociedade.
Além disso, queremos também que o Executivo tome decisões de ordem emergencial para combater os graves problemas enfrentados pelo setor produtivo, que ameaçam sucatear boa parte da indústria e agravar ainda mais a crise do emprego.
Não existe emprego sem empresa. Garantir o emprego é garantir a base industrial do país. Esse é o princípio que une empresários e trabalhadores e que mobilizou recentemente as lideranças da Fiesp, da CNI, da CUT e da Força Sindical.
As reformas e os ajustes na economia, que garantam a continuidade da estabilização e do sucesso do Plano Real, não podem mais sofrer protelações.
O Brasil não pode mais esperar até porque o tamanho de sua dívida social já está gerando consequências incontroláveis, como a inadmissível tragédia que vivemos recentemente no Pará.
Ela está, sem dúvida, intimamente ligada à questão do desemprego e à necessidade de que se faça no país uma verdadeira reforma agrária, sem violência, dentro da lei e da ordem.
Por isso as lideranças da indústria e dos trabalhadores se reuniram na semana passada, em São Paulo, e acordaram uma espécie de pacto em nome dos interesses maiores do país e acima das eventuais e naturais divergências entre capital e trabalho.
Na defesa do emprego e da realização das reformas, nós iremos até o limite necessário. E, se necessário for, iremos até a paralisação simbólica de empresários e trabalhadores num dia de protesto nacional. Seremos capazes de parar o Brasil para o Brasil não parar.
É claro que há pontos da reforma da Constituição sobre os quais divergimos, empresários e trabalhadores. Mas no quadro de dificuldades que o Brasil vive hoje, não podemos começar nosso entendimento pelas divergências.
Temos que construir um novo país a partir dos pontos de consenso. E há muitos, a começar pela urgência de uma reforma tributária. Mais de cem entidades representativas do empresariado e dos trabalhadores já assinaram uma proposta comum de reforma tributária e sugestões de discussão sobre as relações de trabalho.
Pretendemos, juntos, ir a Brasília entregar nossa proposta ao presidente da República. Até porque há convergências, inclusive com o governo, sobre muitos problemas conjunturais que agravam as dificuldades da indústria e facilitam o avanço do desemprego.
Ministros de Estado têm se manifestado quanto à pesada carga de juros vigente na economia. Ou ainda em relação à demora com que está sendo conduzida a regulamentação de outras reformas já aprovadas pelo Congresso.
A regulamentação da queda dos monopólios, por exemplo, seria com certeza um fator gerador de investimentos e de empregos.
Trabalhar sobre as convergências foi a decisão salutar tomada nas reuniões com a CUT e a Força Sindical. E não nos preocupou apenas a organização de movimentos de pressão, como aliás será a grande concentração da indústria, programada para o dia 22 de maio em Brasília, na defesa das reformas.
Decidimos com a CUT, por sugestão do seu presidente, criar um fórum para a elaboração de uma política industrial para o Brasil.
Não há política industrial no Brasil. Há uma política industrial mundial, que pode transformar nosso país numa imensa zona franca, caso continuem a concorrência desleal e o "dumping" social promovidos por um processo malnegociado de importações.
A abertura é um fato irreversível e desejável, mas precisa ser realizada com controle suficiente para preservar a indústria nacional que gera empregos, riqueza e modernização tecnológica.
Com a Força Sindical e o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, iniciamos um trabalho de discussão sobre pontos em comum para a elaboração de projetos que serão encaminhados ao Congresso Nacional.
A democracia tem amadurecido e aproximado as lideranças de empresários e de trabalhadores. Os problemas do Brasil e a necessidade de construção de um novo país têm exigido ainda mais essa aproximação.
Não temos, é claro, ilusões sobre nossas divergências. Vamos chegar a elas e discuti-las com serenidade e respeito mútuo. Mas as bases para essa discussão devem ser inauguradas a partir dos pontos de consenso.
E o consenso hoje começa pela necessidade de propostas e de pressão legítima e democrática de toda a sociedade junto ao Executivo e ao Congresso.
Nesse aspecto nada nos separa. E, em último caso, se necessário for, chegaremos a uma paralisação simbólica que finalmente desperte os que têm o poder, legitimado pelas urnas, de mudar a face do Brasil.

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