São Paulo, terça-feira, 30 de abril de 1996
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Teatro adere ao marketing e orçamentos explodem

ELVIS CESAR BONASSA
DA REPORTAGEM LOCAL

O teatro brasileiro está apostando no marketing. Os orçamentos de várias peças em cartaz ou que vão estrear nos próximos meses têm mais dinheiro destinado à mídia do que à produção propriamente dita.
"Pérola", de Mauro Rasi, teve gastos em torno de R$ 710 mil, mais do que Carla Camurati gastou para fazer o longa-metragem "Carlota Joaquina". Mas só R$ 200 mil foram para o palco ou gastos de viagem. O resto, R$ 510 mil, foi consumido em propaganda.
O espetáculo "A Quarta Estação" fica em situação semelhante. Dos R$ 600 mil de orçamento, R$ 400 mil foram para a mídia -isso porque a produção economizou cortando outdoor e rádio AM.
Os produtores teatrais ouvidos pela Folha concordam que esse é um fenômeno recente. Uma das razões é a necessidade de recuperar o teatro como hábito cultural, concorrendo com opções de lazer.
"Há dez anos, não existia tanta necessidade de mídia. Hoje tem muito vídeo e TV. Essa geração formada pela TV não lê nem roteiro de teatro nos jornais, tem que ter anúncio com impacto visual", diz Jorge Takla, que está produzindo "Masterclass", com estréia marcada para julho.
Ele prevê gastos totais em torno de R$ 500 mil, mas o valor pode crescer. "Depende da mídia que vamos usar no lançamento", diz Takla. "Queremos fazer um lançamento estrondoso."
Patrocínio
Outro fator de crescimento dos gastos com mídia são os patrocínios, com uso das leis de incentivo, que dão desconto em impostos para quem investe em cultura. As empresas que entram com recursos valorizam muito o plano de divulgação do produto cultural que vão patrocinar. Em alguns casos, bancam exclusivamente a mídia.
O dinheiro correspondente a esses gastos raramente passa pela mão do produtor cultural. O patrocinador, em geral, negocia diretamente com os órgãos de comunicação e dá, para o espetáculo, os anúncios publicados.
Outra forma é o próprio órgão de comunicação entrar como patrocinador. Publica o anúncio e lança o valor correspondente como patrocínio, passando a fazer jus aos descontos em impostos.
"As leis de incentivo à cultura têm sido fundamentais para isso", diz Márcia Halfin, da Casa da Gávea, que produziu "Pérola".
Inversão
Mesmo as produções que ficam abaixo dos R$ 500 mil têm seus orçamentos aumentados pela divulgação. Cláudio Kahns, produtor da peça "Frida", de Ricardo Halac, com estréia em maio, acha difícil fugir desses gastos.
"É preciso investir muito para aparecer aquilo que você faz." A produção está orçada em R$ 240 mil -metade para a peça, metade para a mídia.
Kahns lamenta que seja assim. "O ideal seria inverter a equação, gastar muito mais com a produção", diz. E propõe que os órgãos de comunicação dêem descontos altos para a cultura. "Podiam cobrar 20% da tabela."
Francisco Marques, que produz "Uma Coisa Muito Louca", de Flávio de Souza, com estréia prevista para agosto, diz que está com R$ 150 mil calculados para a mídia e R$ 100 mil para os outros gastos. Esses últimos podem crescer e no máximo empatar com divulgação.
"Sem propaganda, não tem público. O volume de informações em São Paulo é muito grande. Você precisa gritar para ser ouvido."

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