São Paulo, quarta-feira, 1 de maio de 1996
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MÍNIMO DEMAIS

A decisão sobre o reajuste do salário mínimo é, sem dúvida nenhuma, a que coloca em cena de modo mais imediato e frontal o problema da distribuição de renda no Brasil. Quantos políticos, candidatos e governantes já não se manifestaram a favor de uma política "de longo prazo" para a recuperação do mínimo?
No curto prazo, entretanto, os obstáculos são sempre enormes e não é raro escutar a velha tese de que é preciso esperar "o bolo crescer" para só então poder dividi-lo.
A decisão do governo FHC, de não conceder um reajuste integral do salário mínimo pela inflação dos últimos 12 meses, a muitos parecerá uma variante da antiga desculpa de que mudar o perfil de distribuição de renda no país é coisa para um distante e sempre imaginário longo prazo.
De fato, existem razões de sobra para ver na "desindexação" do mínimo, pelo menos, uma ressonância tardia da velha tese de que os salários são inflacionários.
Os técnicos do governo, entretanto, evitam esse discurso. A principal razão apresentada para a minimização do mínimo é a necessidade de evitar impactos maiores sobre as contas públicas, em especial as municipais.
E o que fizeram os governos, em especial o federal, para promover o ajuste fiscal que permitiria um mínimo maior? Nada, ou pior até, aumentou o déficit público desde o início do Plano Real, em julho de 1994.
O salário mínimo, quando surgiu o real, valia R$ 64,79. Para complicar a vida dos mais pobres, logo depois do plano a cesta básica saltava de cerca de R$ 80 para R$ 100. Mais ou menos um ano depois, concedido um reajuste de 42,9% para o mínimo em maio de 1995, os pesquisadores do Dieese constatavam: o rendimento dos 10% mais ricos tinha aumentado 2,6%, enquanto os 10% mais pobres tinham melhorado seu rendimento mínimo em quase 37%.
Mas hoje, quase dois anos depois do lançamento do real, a cesta básica continua acima dos R$ 100. Para quem ganha o mínimo, portanto, a melhora é apenas milimétrica, para dizer o menos.
Pior ainda: desde maio do ano passado a inflação acumulou cerca de 20%, bem acima dos 12% de reajuste definido pelo governo. Há portanto uma regressão evidente. O imperativo de distribuir renda fica enfraquecido e os ganhos reais, com o real, são cada vez menores.

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