São Paulo, domingo, 12 de maio de 1996
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FHC lança plano para direitos humanos

EMANUEL NERI

EMANUEL NERI; HAROLDO CERAVOLO SEREZA
DA REPORTAGEM LOCAL

Segundo o presidente, a injustiça no Brasil 'chegou num ponto trágico: a desvalorização da vida'

HAROLDO CERAVOLO SEREZA
Abalado por assassinatos de crianças e chacinas de presos, favelados e sem-terra, o Brasil conhece amanhã o seu PNDH (Programa Nacional de Direitos Humanos). É o terceiro país a adotar um plano dessa natureza.
Com 168 propostas, o programa que o presidente Fernando Henrique Cardoso apresentará promete tratamento igualitário perante a lei e combate a preconceitos.
Abrange desde conceitos sobre liberdade e cidadania até medidas para a criação de uma cultura de direitos humanos no Brasil.
O PNDH surge num momento em que a imagem externa do país está arranhada pelo decreto presidencial que permitiu a contestação de áreas indígenas e pela matança de 19 sem-terra em Eldorado do Carajás (PA), em abril.
Tão grave quanto as chacinas é a quase certeza de impunidade. No Brasil, os crimes praticados por policiais militares são julgados por tribunais militares.
Massacres como o do Carandiru, há quatro anos, em que 111 presos foram mortos, não levaram ninguém para a cadeia.
Apesar das dúvidas das entidades de direitos humanos, FHC promete combater a impunidade.
Uma das medidas de curto prazo do programa prevê a transferência para a Justiça Comum do julgamento de policiais militares.
"A injustiça em nosso país chegou num ponto trágico: a desvalorização do maior de todos os nossos bens, a vida dos cidadãos brasileiros", diz FHC na mensagem que acompanha o plano.
Para o presidente, seu programa de direitos humanos vai "estancar a banalização da morte".
O Brasil é de fato um país em que os direitos humanos ainda estão na Idade da Pedra. O país tem uma recorde triste: o assassinato de quatro crianças por dia.
Os índices de crimes violentos também são altíssimos. As taxas nacionais de homicídios entre 1981 e 1990 pularam de 12,3 para 21,3 mortos por cada 100 mil habitantes. É quase cinco vezes a média dos países europeus.
No campo da impunidade, o plano quer acabar com a tortura, uma prática sistemática nos distritos policiais do país contra suspeitos de crimes comuns.
A Constituição considera a tortura um crime inafiançável, mas não há leis específicas para punir os torturadores.
O plano tenta atingir todos os alvos discriminados do país -crianças, índios, deficientes físicos, negros, migrantes, idosos e mulheres. Na proposta de tratamento igualitário das pessoas, promete medidas para melhorar as condições de atendimento de portadores de HIV/Aids.
Mas deixou de fora setores igualmente marginalizados. Não são apontadas medidas, por exemplo, para acabar com a impunidade de assassinos de homossexuais.
O PNDH nasceu a partir de recomendação da Conferência Mundial dos Direitos Humanos, em 1993, em Viena (Áustria). Além do Brasil, apenas Austrália e Filipinas já elaboraram seus planos.
Concretizado a partir de projeto do cientista político Paulo Sérgio Pinheiro, do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo, o programa recebeu aval de entidades de direitos humanos de todo o país.
Mas há o temor de que o plano fique só no plano das intenções, sem ser executado.

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