São Paulo, domingo, 12 de maio de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Quando o filho é melhor

BARBARA GANCIA
COLUNISTA DA FOLHA

O comendador Enzo Ferrari que me perdoe, mas, na minha modestíssima opinião, Gilles Villeneuve nunca foi aquela fera de que os ferraristas tanto se vangloriam.
Claro, dava show, guiava de maneira espetacular, deixava a galera de cabelo em pé.
Mas um campeão mundial não se faz só com braço e pé pesado.
É preciso ter cérebro.
A cavalaria "rampante" pode relinchar o quanto quiser. O videoteipe do acidente que matou Gilles Villeneuve em treino, na Bélgica, mostra que ele morreu porque vinha babando na balaclava.
Não viu nem a cor do carro à sua frente.
Certa vez, na Europa, Gilles quase foi parar no xilindró com seu amigo Didier Pironi, piloto de F-1 que acabou morrendo em uma corrida de barco offshore.
Os dois tinham por hábito sair pilotando helicóptero como quem anda de patinete.
Em vez de seguir as vias aéreas destinadas a helicópteros, eles se deslocavam de lá para cá voando baixo sobre estradas.
Pois me diga, emérito admirador da casa de Maranello: isso lá é coisa de quem tem a cabeça no lugar?
Conheci Jacques, filho de Gilles, na semana do último GP de Sampa.
O cara é o avesso do avesso do avesso do pai. Não é canadense por acaso. Na tenra idade de 25 anos, se mostra mais frio até do que nariz de foca da Baía de Hudson.
Acompanhei uns amigos que iriam entrevistar Jacques em uma sala do hotel Sheraton, onde ele estava hospedado.
No final da conversa, não me contive e, enxerida que sou, aproveitei para fazer umas perguntas.
Primeira: "Seu pai morreu no acidente mais dramático da F-1 registrado em filme. Como é que você pode ser piloto?" Ele: "Quando meu pai morreu, eu tinha 11 anos, nem me lembro daquela época".
Segunda: "Quando é que vamos ver de novo um Villeneuve pilotando uma Ferrari?" E ele: "Correr não é só pilotar uma Ferrari, não faço questão nenhuma".
Jacques mostrou em Interlagos que ainda tem muito a aprender em pista molhada. Por outro lado, deu show em Melbourne e segurou o Schumacher na Alemanha como gente grande.
Anda forte como o pai, mas é mais ponderado e tem maior visão de corrida do que Gilles, que só queria pisar fundo.
Trata-se de um Villeneuve com estofo de campeão do mundo.

Texto Anterior: Jacques quer uma própria identidade
Próximo Texto: Família Villeneuve
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.