São Paulo, quarta-feira, 15 de maio de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A satisfação do cliente-contribuinte

Sem uma reforma fiscal e administrativa os governantes estarão de mãos amarradas para satisfazer o contribuinte
EMERSON KAPAZ
Entre os vários desafios enfrentados pelos governos modernos está o de atender de forma adequada às demandas sociais. Trata-se de uma tarefa complicada por estarem os orçamentos do governo federal e da grande maioria dos Estados comprometidos com o pagamento do funcionalismo.
Acrescentem-se a essa dificuldade os déficits financeiros herdados de administrações anteriores. Somem-se outros déficits nas áreas de saúde, habitação, transportes, agrária e teremos um quadro das dificuldades dos governantes em atender às demandas sociais.
É nesse ponto que a nova visão de administração oferece uma contribuição relevante aos administradores públicos. Em uma economia globalizada, não basta que uma empresa forneça produtos e serviços que atendam às necessidades de seus clientes. É preciso ir além, buscando a satisfação do consumidor como um todo. Altos níveis de endividamento, comprometimento dos ingressos com pagamento de salários, encargos e tributos, tudo isso é até certo ponto administrável. Mas se o consumidor estiver insatisfeito, o produto final dessa empresa não emplaca.
Assim, para o governo, não basta ter uma visão global das políticas a serem implementadas e estar permanentemente voltado à macroadministração pública. É preciso simultaneamente adotar um conjunto de ações sociais localizadas visando à satisfação do cliente, no caso, o contribuinte.
O estadista precisa também atuar permanentemente como síndico. No caso de conflitos como o que resultou no massacre de Eldorado do Carajás, fica cada vez mais claro que é preciso ir além da formatação de uma política de reforma agrária. É preciso agir na implementação de ações práticas e jurídicas visando a multiplicação dos assentamentos. E, sobretudo, acompanhar e cobrar diariamente a concretização dessas ações.
Da mesma forma, não basta que o real esteja estabilizado se o contribuinte se sente cada vez mais inseguro diante de um potencial aumento do desemprego. Aproveito para lembrar palavras do próprio presidente Fernando Henrique Cardoso, em discurso em Corumbá de Goiás, em 19 de abril, e que passaram despercebidas de toda a mídia:
"Nossa responsabilidade como governantes é fazer com que o Brasil arcaico dê lugar a um Brasil moderno. E moderno não quer dizer quinquilharia importada. Moderno quer dizer condição de vida decente para o povo do Brasil e acesso ao trabalho".
Assim, não basta atrair investimentos de novas empresas estrangeiras, que ainda levarão algum tempo para gerar novos empregos. Também é preciso acelerar a queda dos juros de modo a permitir novamente o aumento da demanda a fim de estimular a abertura de novos postos de trabalho já.
Entretanto o síndico somente poderá modernizar um edifício arcaico se conseguir reformar sua estrutura. Caso não troque a coluna-mestre, verá multiplicados os vazamentos, mesmo se todos os apartamentos reformarem seus encanamentos.
Enquanto não fizermos uma profunda reforma fiscal e administrativa, os governantes estarão de mãos amarradas para satisfazer o contribuinte. Enquanto não se concretizar uma reforma tributária, as empresas continuarão pagando o elevado "custo Brasil" que dificulta o aumento dos investimentos em produtividade. Enquanto não houver uma profunda reforma previdenciária, continuaremos às voltas com um déficit público crônico em vez de contar com recursos para novos investimentos públicos sociais.
Só por meio da conjugação de uma visão global com ações locais é que poderemos enfrentar, como administradores públicos, os desafios deste fim de século e do próximo milênio.
Emerson Kapaz, 40, empresário, é secretário de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo.

Texto Anterior: Diagnóstico falho, proposta equivocada
Próximo Texto: Saúde; Indenização negada; Debate programático; Divulgação; Frases ocas; Demagogia barata; Pequenos atos
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.