São Paulo, quinta-feira, 16 de maio de 1996
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Fuga da Detenção custa até R$ 50 mil

MARCELO GODOY
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma fuga da Casa de Detenção pode custar até R$ 50 mil. O mercado no maior presídio da América Latina (no Carandiru, zona norte de São Paulo) também oferece mudança de celas, drogas, armas, ferramentas para fugas e aparelhos eletrônicos aos presos.
Agentes penitenciários são os responsáveis por uma parte dos negócios. Mas há também comércio entre os presos. As moedas usadas são dinheiro, informação, drogas, roupas e cigarros.
"Alguns agentes são aliciados durante o convívio com os presos e adquirem esses vícios", afirmou Paulo Gilberto de Araújo, 44, diretor do sindicato dos agentes penitenciários de São Paulo, que também trabalha na Detenção.
O secretário da Administração Penitenciária, João Benedicto de Azevedo Marques, afirmou que essa é uma situação particular da Detenção. "A nova diretoria está tomando medidas para moralizar o presídio", afirmou.
A Folha apurou que as vendas de fugas e de favores não têm um preço definido. Ele varia de acordo com o poder aquisitivo do preso, e não é determinado por uma pessoa ou por um grupo. São considerados presos ricos os ladrões de bancos e traficantes.
Segundo a polícia, uma fuga do presídio pode custar de R$ 5 mil a R$ 50 mil. Um funcionário pode permitir que o preso saia em um caminhão que faz entregas no presídio.
Ferramentas
Se o preso não quiser comprar a fuga, ele pode tentar obter ferramentas que possibilitem a construção de um túnel ou a escalada da muralha.
Na semana passada, 51 presos fugiram da Detenção. Eles construíram um túnel de cem metros. Para isso usaram macacos hidráulicos e ventiladores, provavelmente conseguidos dentro da Detenção.
Em 25 de outubro passado, três presos do pavilhão 7 conseguiram três revólveres. Fizeram uma corda com lençóis e escalaram o muro. Na fuga, balearam um PM. Eles foram recapturados, mas não disseram como obtiveram as armas.
Imóveis
O comércio mais comum na Detenção é o de celas, ou "barracos", como as chamam os presos. As regras que determinam o valor de uma cela entre os presos são semelhantes às do mercado imobiliário.
Um barraco com vista para a rua é mais valioso do que um com a janela voltada para o pátio interno do pavilhão. Morar em um "barraco de avenida" também é um privilégio disputado.
Essas celas são localizadas nas esquinas dos corredores dos pavilhões. Elas são mais valorizadas porque o preso pode ter uma visão melhor do que está acontecendo no presídio. Quem determina em que cela cada detento deve ficar são os agentes penitenciários.
Uma mudança de cela pode custar ao preso até R$ 100, mas ele também pode conseguir esse privilégio se fornecer aos funcionários da prisão informações sobre um plano de fuga ou sobre um depósito de armas e de drogas de outros detentos.
"Geralmente, quem faz esse tipo de troca com o agente é o preso que está 'aperreado' em sua cela. O funcionário depende de informação para saber o que os presos estão fazendo", afirmou o diretor do sindicato dos agentes. O preso "aperreado" é o que está sendo humilhado pelos colegas de cela.
Esses presos também podem conseguir uma vaga em outros pavilhões, como o 2 e o 4, onde o número de presos por cela é menor. Neste casos, a transferência pode custar até R$ 200, mas também pode ser feita por meio de fornecimento de informações.
Correntes
Além das celas, os presos também podem manter correntes de ouro, relógios, tênis e roupas de marcas famosas na celas. Esses objetos também são usados como moedas na cadeia.
O detento Rodnei Hernandes, um dos 51 que fugiram do pavilhão 7 por um túnel na semana passada, tinha duas correntes douradas no pescoço. "Ele disse que eram de ouro", afirmou o tenente-coronel Antônio Carlos Mariano, chefe do batalhão que guarda o presídio.

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