São Paulo, domingo, 19 de maio de 1996
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Outras considerações sobre o SFH

MÁRIO LÚCIO MARCHIONI

Que a falta de moradias é um dos problemas mais graves do Brasil e que é necessário encontrar soluções para a questão, ninguém contesta. Esse é o objetivo do Sistema Financeiro da Habitação (SFH).
As principais fontes de recursos do SFH são a caderneta de poupança e o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).
Deles é retirado dinheiro para financiar a aquisição da casa própria. Sendo dinheiro alheio, é necessário que retorne à sua origem.
Daí a necessidade de o financiamento ser pago. Para isso, há evolução financeira de uma dívida, como deveria parecer óbvio.
Aplicam-se aqui critérios de matemática financeira, segundo os quais evolui a dívida, e não de acordo com o valor de mercado.
A condição do mutuário é a de devedor em uma obrigação mútua. Não é a condição de locatário, arrendatário ou qualquer outra.
O vínculo com o imóvel existe em dois pontos: 1) O mutuário se fez devedor para poder adquiri-lo; 2) O imóvel é garantia do pagamento da dívida.
O fato de dar o imóvel como garantia hipotecária limita os direitos de proprietário. Inclusive quanto à alienação.
Se a Constituição garante certos direitos, o faz nos limites definidos nela e na lei. Não fosse assim, qualquer ato poderia ser questionado perante a Constituição.
A renda dos mutuários não acompanhou a evolução da dívida que assumiram. Para contornar o problema, adotaram-se medidas que desequilibraram o sistema, a ponto de quase inviabilizá-lo.
As consequências são desanimadoras: muitos agentes do SFH quase paralisaram as operações de financiamento habitacional.
Foi gerado um saldo que não foi coberto pelas prestações. Essa diferença é assumida pelo Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS).
A dívida estimada do FCVS é suficiente para produzir 10 milhões de moradias no valor de R$ 5.100. Mas nem isso é possível, pois é preciso cobrir a dívida deixada por quem já conseguiu sua moradia.
A produção de conjuntos habitacionais muitas vezes não contou com participação de municípios, Estados ou beneficiários. Isso agregou ao financiamento custos que acabaram elevando o custo do imóvel acima do valor de mercado.
A previsão de seguros é comum em todo tipo de empréstimo. No caso do SFH, há uma especificidade: trata-se de contrato de longo prazo, com prêmios sujeitos ao reajuste das prestações, fator que torna difícil a comparação com outros contratos de seguro.
O SFH é apenas uma das soluções para o problema habitacional, destinado àqueles que possam pagar por uma dívida.
Infelizmente, a situação dos brasileiros é a de nem isso poder. Urge, ainda, repensar a legislação brasileira, que protege de modo ferrenho a propriedade imóvel, mesmo contra os interesses e necessidades sociais.
É preciso admitir que essa questão, como outras, só terá solução adequada quando a sociedade brasileira se convencer da necessidade e urgência de promover melhor distribuição de bens e de renda.

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