São Paulo, domingo, 19 de maio de 1996
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A Beverly Hills de São Paulo

MARCELO MANSFIELD
ESPECIAL PARA A FOLHA

Nos anos 60, São Paulo era ainda uma cidade onde os garotos podiam pedalar suas bicicletas em passeios pré-tracking, sem se preocupar (muito) com o trânsito ou assaltos. E se você morasse na zona oeste, e gostasse de música e TV, os motivos para bons passeios, então, se multiplicavam.
A Pompéia, onde fui criado, era chamada de "A Liverpool da Paulicéia", numa clara referência aos "Beatles".
Era comum pra nós, deparar com o Fairlane azul-claro dos "Mutantes" na rua Venâncio Aires, ou ouvir o barulhento "Made in Brazil" ensaiar na esquina da rua Caraíbas, a poucos metros do idolatrado estádio Palestra Itália, o Palmeiras, onde em suas piscinas podíamos cruzar com outra instituição do bairro, o internacional "Periquitos em Revista", grupo de patinação que rivalizava em quantidade de pernas de fora com o "Holliday on Ice".
Época maior da jovem guarda, nada como fazer plantão na rua Cotoxó, onde o pessoal dos "Incríveis" se encontrava na casa do Nenê.
Mais para o centro, estava a TV Paulista, depois Globo, onde Eloísa Mafalda matava todos de rir em "Gafe e Etiqueta", programa de boas maneiras de Marcelino de Carvalho. Em frente, a sorveteria Whiskie, parada obrigatória nos domingos à tarde.
Meu irmão, Marcos, cujo espírito aventureiro e invejável capacidade de liderança era admirado por todos, foi quem primeiro me levou, e ao nosso pequeno grupo de bicicleteiros, ao meu local favorito desse lado da cidade: o Sumaré.
Nas várias pedaladas morro acima, pude ver Marília Pera e Luiz Gustavo discutindo as dificuldades de se ter um volante inglês em plena São Paulo dos anos 60, numa cena externa de Beto Rockefeller, gravada numa rua do bairro, assim como vi Suzana Vieira de mãos dadas com seu então noivo Régis Cardoso, em pleno domingo à tarde, como dois simples pombinhos, Hebe Camargo saindo de sua casa com seu Impala último tipo e Wilma Bentivegna estreando seu novíssimo Aero Willys 2.600.
Clenira Michel mantinha conta num banco da Alfonso Bovero. Marisa Sanches, depois de cantar o tema de "Woody Woodpecker" no "Almoço com as Estrelas", fazia compras no pequeno centro comercial da mesma rua.
O cardápio do "Almoço com as Estrelas", apresentado por Lolita e Aírton Rodrigues, vinha da "Cantina Don Ciccilo", a menos de um quilômetro de distância, local preferido no dia das Mães e dos Pais.
Walter Forster, galã número um, e sua esposa Dona Branca, moravam em uma bonita casa numa das inúmeras ladeiras do bairro, assim como Cesar Monteclaro, egresso do rádio, Vida Alves, Xisto Guzzi e Percy Aires.
Um calhambeque estacionado na porta da TV Tupi era sinal que "Fuzarca e Torresmo" estavam a todo vapor dentro do estúdio... Lenda ou realidade, para nós, aquele carro era deles. E depois do almoço, o olfato mais apurado podia sentir o cheiro da "Cozinha de Ofélia" dentro da "Revista Feminina" de Maria Teresa Grégori.
Lá pelas tantas, meu irmão dava a voz de partida, e todos nós, eu, Lalo e Marquinhos, subíamos em nossas bicicletas e nos despedíamos da Beverly Hills do Sumaré, para voltarmos a tempo para o jantar na Liverpool da Paulicéia. Semana seguinte, era vez da Rodeo Drive, ou seja, rua Augusta, onde um dia, em 1973, vi um amontoado de silicone fazendo compras... era a Raquel Welch.
Não dormi três dias, por motivos que todos nós conhecemos.

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