São Paulo, sábado, 25 de maio de 1996
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Mapplethorpe cria estética do escândalo

MARCELO REZENDE
DA REDAÇÃO

Para os pintores, performáticos, cineastas e músicos que viveram os anos 80 da América, o fotógrafo Robert Mapplethorpe teve o papel de Andy Warhol de sua geração.
Houve sexo, sadomasoquismo, couro, correntes, cocaína, LSD e Aids suficientes para que sua vida fosse contada em 429 páginas de "Mapplethorpe: Uma Biografia", da jornalista Patricia Morrisroe, que chega agora ao Brasil pela editora Record.
Mapplethorpe era o escândalo. Quando morreu em consequência do vírus HIV, em 1989, aos 42 anos, deixou de herança para os sobreviventes, além das luzes escandalosamente brilhantes de suas fotos (ele queria reproduzir o que via sob o efeito de drogas), a idéia de que pode ter sido o último artista "visceral" sobre a Terra.
Era um homem que, literalmente, abusava de suas próprias obsessões e desejos, não se poupando das atitudes mais desonestas para se fazer visto, notado e, nos conta Patricia Morriesroe, também usado. Ou, em uma palavra que talvez o próprio Mapplethorpe apreciasse mais, possuído.
A carreira daquele que já foi chamado de "o maior fotógrafo de estúdio de seu tempo", e que se tornou símbolo da luta pela liberdade de expressão em seu país (leia texto abaixo) é contada em seis partes e inúmeros capítulos, que descrevem os detalhes sórdidos da adolescência à morte.
Para a biógrafa Patricia Morrisroe, a vida de Mapplethorpe vale o clichê de que se lê como um romance -uma literatura criada por uma mente perturbada.
Nascido de uma família de classe média do bairro do Queens, em Nova York, sua educação foi a de um típico menino católico, sofrendo pela iminência de passar a eternidade no inferno. No início da puberdade, quase foi preso por roubar pornografia gay de um jornaleiro cego.
Depois de tentar uma vida heterossexual, morar com um macaco (que cozinhou, arrancou a pele e transformou em um instrumento musical), se viciar em qualquer tipo de droga e alimentar uma relação amorosamente doentia com a cantora Patti Smith, terminou tendo sua arte descoberta pelo curador John McKendry e, mais tarde, pelo milionário Sam Wagstaff.
Foram homens que se apaixonaram perdidamente por sua beleza sinistra, de seu corpo e seus quadros, fazendo com que o nome Mapplethorpe se tornasse uma espécie de nova marca, a fotografia vencendo a herança dos temas sociais.
O que ele fotografava era sua crença de que a arte era um assunto ligado à magia e ao fantástico. Assim, não poderia estar preso às preocupações de ordem moral. Seu tema era o choque.
Morrisroe chega perto de Mapplethorpe, mas nunca o toca. Sua biografia alinha os fatos e suas sujeiras e mesquinhezas, se ausentando da tentativa de entendê-lo.
Para "Mapplethorpe: Uma Biografia" também vale outro clichê: o artista é maior que o bisbilhoteiro de sua intimidade.

Livro: Mapplethorpe: Uma Biografia
Autora: Patricia Morrisroe

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