São Paulo, segunda-feira, 27 de maio de 1996
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CD revela sonoridade dos tambores de Benin

OTÁVIO DIAS
DA REDAÇÃO

Em 1987, o musicólogo brasileiro Marcos Branda Lacerda, 41, viajou durante dois meses e meio pelo Benin, país situado na costa oeste da África, onde pesquisou a música de culto dos povos iorubás, realizada apenas com tambores.
Então estudante na Universidade Livre de Berlim (Alemanha), Lacerda registrou cerca de 15 grupos de percussão, num total de dez horas de fita. A pesquisa transformou-se em tese de doutorado e em agora num CD.
"Tambores Iorubás do Benin, África Ocidental" tem 19 faixas e 65 minutos. O CD tem especial interesse para o Brasil porque os iorubás, trazidos como escravos à então colônia portuguesa, marcaram em definitivo nossa cultura e religião.
O CD, no entanto, surpreenderá aqueles que esperam ouvir uma percussão semelhante à do grupo baiano Olodum ou de uma escola de samba.
Tambores de membrana
Lacerda destaca a "austeridade" da música iorubá. "Todos os instrumentos são membros de uma mesma família: tambores de membrana. Não há, como no samba, instrumentos de metal ou de madeira", diz.
Um típico conjunto iorubá é composto de cinco instrumentos. Quatro fornecem a base rítmica e o quinto -o tambor-mãe- é o solista. Ele acrescenta e retira elementos sobre uma base rítmica que se repete, com pouco espaço para improvisação.
"O samba é mais anárquico", diz Lacerda. "O instrumentista não pode atravessar, mas não há um compromisso de se repetir a mesma figura rítmica".
"No Olodum ou nas escolas de samba, o surdo é o instrumento mais fixo; a variação fica a cargo do tamborim, por exemplo", diz Lacerda. "Já na música iorubá, os tambores mais agudos variam pouco e o tambor-mãe tem mais mobilidade."
Lacerda, hoje professor do departamento de música da Escola de Comunicações e Artes da USP, foi em busca da percussão original dos iorubás de etnia Ketu, habitantes do Benin.
A fascinação pelo ritmo como um dos elementos fundamentais da música é o que levou Lacerda a viajar ao Benin. Ele procurou estudá-la de forma autônoma, desvinculada dos momentos de culto.
"Seria muito difícil, em pouco tempo, compreender o papel religioso da música iorubá. Concentrei-me apenas em suas características rítmicas", afirma.
Ele também evita descrever as culturas que encontrou durante a viagem. Para ouvidos menos especializados, o que chama atenção é a força e a rapidez das batidas, assim como sua repetição.
Se, por um lado, o ouvinte é remetido ao cenário de uma cultura primitiva perdida na África Ocidental, por outro, não dá para não lembrar das loucuras da pista de dança de um club tecno.

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