São Paulo, segunda-feira, 27 de maio de 1996
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O que desejam os empresários?

FERNANDO BEZERRA

O que foram fazer em Brasília mais de 2.500 empresários de todo o Brasil no Encontro Nacional da Indústria? O que uniu grandes empresários paulistas, de Antonio Ermírio de Moraes e Paulo Cunha ao padeiro de Goiânia Mário Queiroz ou ao microempresário Benedito Silva, de Minas?
Certamente não foi o desejo de protestar contra o plano de estabilização que, ao contrário, recebeu amplo e total apoio dos participantes. Não foi, igualmente, a intenção de apresentar algum rol de reivindicações. Nosso propósito consistiu em proceder a uma avaliação profunda da situação da indústria brasileira e propor alterações nos rumos da política econômica, defendendo intransigentemente a necessidade de que as reformas constitucionais sejam votadas pelo Congresso, sem o que o Plano Real não terá longa vida.
Ao nos reunirmos em Brasília, quisemos dar início ao processo de mudança na forma de atuação do empresariado industrial. Entendemos que a indústria desempenha papel estratégico no desenvolvimento do país e deve ter um peso correspondente na formulação das políticas do setor. Para tanto, elaboramos agenda de prioridades, pela qual vamos lutar de forma clara, transparente e decidida.
As organizações representativas da indústria consideram que as reformas constitucionais são indispensáveis para a estabilidade da economia. Além do que vem sendo votado no Congresso, queremos em especial que a reforma tributária seja tratada com absoluta prioridade.
A nosso ver, não lhe tem sido atribuída a primazia necessária. Salta à vista que o esforço de redução do tamanho do Estado, que se espera que possa a reforma administrativa assegurar, precisa ser acompanhado, simultaneamente, da racionalização dos tributos. Em vez disso, o governo sinaliza em sentido contrário, como demonstra o empenho na restauração de imposto obsoleto, incidindo sobre a movimentação financeira e destinando-se a atuar de forma cumulativa sobre todas as etapas da produção.
Centrada nas providências que possam resultar na progressiva redução do "custo Brasil", a agenda da indústria não se esgota nesses limites. A educação e a qualificação da mão-de-obra são os instrumentos mais importantes para a formação da capacidade competitiva de um país. Além disso, a educação básica é condição fundamental à geração de uma força de trabalho com consciência de sua cidadania e tem impacto decisivo sobre a distribuição de renda.
Como conclusão destacada do encontro, ressalto o reconhecimento de que o caminho a seguir não pode consistir no comportamento ditado pelo imperativo da sobrevivência isolada ou de interesses de setores específicos. Temos que alcançar políticas que estabeleçam perspectivas definidas para o setor industrial como um todo.
O essencial da política industrial há de consistir na criação de condições favoráveis aos investidores potenciais, tratando de reduzir drasticamente os custos da produção. Somente esse resultado pode levar-nos à superação do quadro de dificuldades em que nos encontramos. Dessa conjuntura é que resulta a magnitude das reformas. Pela eliminação dos obstáculos que constituem o "custo Brasil" criar-se-á, para o empresariado brasileiro, igualdade de condições na competição com os concorrentes estrangeiros, além da possibilidade da criação dos empregos necessários para receber os milhões de brasileiros que precisam trabalhar e ter uma vida digna.
Ao final do seu discurso no encontro, o presidente Fernando Henrique Cardoso, de cuja honestidade de propósitos não se pode duvidar e que tem feito ingentes esforços para conduzir o país no rumo certo, utilizou uma frase célebre de John Kennedy indagando que "os empresários deveriam, antes de mais nada, saber o que eles poderiam fazer pelo país".
Como o protocolo não permite qualquer fala após o discurso presidencial, não pude, respeitosamente, apresentar, em nome de todos os industriais presentes, a minha réplica, o que faço agora: a indústria brasileira tem feito a sua parte. Ninguém ignora que o custo do Plano Real e da abertura da economia recaiu, principalmente, sobre a indústria brasileira.
E ela se modernizou para competir, teve ganhos nunca vistos de produtividade, cortou custos e, em curto espaço de tempo, o Brasil passou a ser o país, na América Latina, cujas empresas receberam o maior número de certificados ISO 9000, o que demonstra, de forma eloquente, como nós nos preparamos para os novos tempos. O "custo Brasil", contra o qual nos rebelamos e que inviabiliza a empresa nacional, precisa ter urgentemente um similar para o setor público, pois é aí, justamente, que reside a fonte dos males que nos afligem.

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