São Paulo, terça-feira, 28 de maio de 1996
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Juros de empréstimos

LUÍS NASSIF

Não há explicação para a apatia dos condutores da política monetária em relação às taxas de juros do crédito.
O Banco Central monitora a economia por meio das taxas de juros dos títulos públicos. Teoricamente, essas taxas deveriam condicionar as taxas de juros dos empréstimos.
No entanto, a diferença entre ambas é estratosférica -de 2% ao mês numa ponta a até 15% ao mês na outra.
A diferença explica-se por um círculo vicioso entre os bancos, que apenas o Banco Central pode romper. Continua elevadíssima a incapacidade de pagamento de vasta faixa da clientela de bancos.
A tática adotada pelos bancos consiste em rolar as dívidas em prazos curtos, a taxas estratosféricas. A cada rolagem, o cliente é obrigado a arcar com os juros. O que não é pago é rolado, sempre a taxas elevadíssimas.
A lógica dos bancos é mortal. Sabem que o cliente amarrado a essas taxas está condenado à morte. Cada banco trata, então, de procurar se ressarcir da maneira mais rápida possível, antes que o infeliz bata com as botas.
Aumentam-se os juros desmedidamente e impõem-se taxas leoninas de cobrança, até o momento em que o infeliz não consegue mais pagar.
Aí, o banco chama para renegociar e estica o prazo -se é que resta algum fôlego para o cliente.
Desarticulação
Essa tática se prende a um problema de desarticulação sistêmica. O raciocínio do banco é que o cliente ali atolado também deve para outros bancos.
Se se afrouxam as condições numa ponta, o que sobrar de dinheiro será apropriado por quem endurecer o jogo.
Clientes mais articulados conseguem renegociações com o conjunto de bancos credores. Mas não é o que ocorre com a maior parte dos micro e pequenos e também com os médios descapitalizados.
Não é por outro motivo que as afirmações do presidente da República sobre as taxas de juros foram recebidas com sarcasmo pela maioria dos empresários presentes à manifestação de Brasília.
Se um banco cobra taxas letais de juros, problema dele. Quando todo o sistema incorre nessa prática circular, o problema é do Banco Central.
Não se trata de sugerir tabelamentos de juros, proibições de cálculos de juros pelo sistema composto e outras excentricidades.
Trata-se de agir como agente coordenador do sistema, impedindo a continuidade dessa política mortal. Se cada banco não pode parar individualmente com essas práticas, para não beneficiar o concorrente, cabe ao BC reunir o sistema e usar de persuasão para reverter esse jogo.
Tem-se um quadro amplo de distorções sistêmicas na estrutura de jogos. Se não é responsabilidade do BC resolver, de quem seria? Do bispo?
É evidente que parte relevante da perda de popularidade de FHC reside na incapacidade orgânica dos condutores da política monetária para assumir responsabilidades e pôr a mão na massa.

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