São Paulo, quarta-feira, 29 de maio de 1996 |
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Caixa traz Luiz Gonzaga sem inéditas
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
Não se confirma, assim, a promessa da gravadora de que a homenagem viria acrescida de material inédito, de quando ele tocava ainda valsas vienenses, tangos argentinos e chorinhos cariocas. O material está em mãos da BMG, em fonogramas gravados em 78 rpm, mas não se garante o lançamento. "Achamos que seria um desrespeito a ele incluir outras músicas", justifica o gerente de marketing Marcelo Falcão. A discussão em torno da preguiça da BMG e da soberania da escolha de Gonzaga é ociosa. Seja como for, fica à disposição agora em CD uma amostra de 60 canções gravadas por ele entre 1941 e 1987. No caminho, encontram-se clássicos que lhe deram lugar ímpar na MPB, a meio caminho entre o fogo do gosto popular e a aprovação da crítica ranzinza: "Asa Branca" (47), "Baião" (49), "Paraíba" (50), "Pau-de-Arara" (52), "O Xote das Meninas" (53). Pelo feito de atingir as duas pontas, Luiz prova-se -"50 Anos de Chão" demonstra-, membro do seleto triunvirato de tradutores do cotidiano do brasileiro -se Noel Rosa traduziu a vida urbana e Dorival Caymmi, a praieira, Gonzaga fez o mesmo ao sertão nordestino. Trajetória Luiz nasceu no sopé da serra do Araripe, em Exu (PE). Aos 17 anos, já era sanfoneiro célebre na região. Aos 27, migrou para o Rio de Janeiro. O primeiro emprego foi na zona de meretrício do Mangue, em que tocou tangos, boleros, valsas. Em 1941, já revertido à raiz nordestina, ganhou o programa de calouros de Ary Barroso. Mas o domínio dos samba de morro -sem falar no preconceito atiçado por vestes de cangaceiro- manteve-o em banho-maria por alguns anos. A reviravolta veio quando conheceu Humberto Teixeira, com quem compôs o épico da opressão nordestina "Asa Branca" (47), que conquistou o país. É deles também "Baião" (49), que ajudou a nominar Luiz Gonzaga "rei do baião" e a popularizar o gênero, cristalizando o formato sanfona-triângulo-zabumba. A dupla viajou à vontade do épico ao lírico. Exemplo é "Assum Preto" (50), evidenciada em toda sua grandeza por Gal Costa em 71. Diz a letra: "Tarvez por ignorância/ Ou maldade das pió/ Furaram os óio do assum preto/ Pra ele assim cantar mió"; mais adiante: "Assum preto, o meu cantar/ É tão triste como o teu/ Também roubaram o meu amor/ Que era a luz, ai, dos óios meus". Luiz tentou ingenuamente se adaptar. "A Morte do Vaqueiro" (63) e "A Triste Partida" (64) revelam-se modalidades estranhas de protesto -ou o que seria, então, "Apologia ao Jumento (O Jumento É Nosso Irmão)", de... 68? Resgate Era a hora de a elite reconhecer o valor de Luiz Gonzaga: em 68, os tropicalistas jogaram na cara da nação sua brasilidade, mixando valores arcaicos e modernos para devolver a Luiz a legitimidade que a fossa e a bossa haviam roubado. Misteriosamente, o que se segue é a perda de viço. O terceiro CD da caixa é tomado por voz já cansada e duetos infelizes com o filho Gonzaguinha, Fagner, Dominguinhos. Tal fase devolveu Luiz ao gueto de casas de forró e nichos vizinhos do brega. O (re)lançamento de "50 Anos de Chão" traz ao CD a possibilidade de que, mais uma vez, se redimensione a colossal importância de Luiz Gonzaga. Caixa: 50 Anos de Chão (3 CDs) Artista: Luiz Gonzaga Lançamento: BMG Preço: R$ 60, em média Texto Anterior: Violoncelista Antônio Meneses toca no Cultura Artística Próximo Texto: Marc Ribot homenageia Monk em CD Índice |
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