São Paulo, quarta-feira, 29 de maio de 1996
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Marc Ribot homenageia Monk em CD

GARY GIDDINS
DO "VILLAGE VOICE"

Não há nenhum aspecto do jazz tão desprezado quanto a guitarra moderna. Antes da Guerra, era possível contar nos dedos de uma mão os músicos de jazz capazes de tocar o instrumento. Mas, por volta de 1960, o manual do guitarrista Barney Kassel estava por toda a parte, e surgiu um exército de dedilhadores de oito notas.
Uma minoria realmente conseguiu permanecer, pela virtude do fraseado das notas em oitavas. Guitarristas demais se pareciam demais com outros guitarristas. O novo CD de Marc Ribot, "Don't Blame Me" (DIV), soa diferente -no mínimo- de outros. Se precisar de um ponto de referência, considere Thelonious Monk.
Ribot, 41, um nativo de Newark, é um típico eclético das escolas de Dowtown. Um estudante do clássico guitarrista e compositor haitiano Frantz Casseus, ele tocou em um Stax/Volt no final dos anos 70 e no início dos anos 80, bem como com Jack McDuff.
Mas cinco anos com o Lounge Lizards asseguraram sua reputação em Downtown. Ele substituiu Arto Lindsay, cuja guitarra parecia ter sido moldada para dar ao ouvinte não menos do que um suave choque elétrico.
Assim, Ribot deu aos Lizards um digno brilho. Na verdade, deu ao grupo mais possibilidades, incluindo um ocasional banjo e também seus solos, que poderiam ser alternadamente metálicos e estridentes.
Ribot tocou com várias personalidades do chamado "avant-pop", incluindo Fowlkes and Nathason's Jazz Passengers, Tom Waits, Evan Lurie, Elvis Costello, John Zorn e mais de uma dezena de outras.
"Don't Blame" é tocado com certo tremor e fúria. A articulação da melodia é a reminiscência da famosa versão de "Criss Cross", de Monk, somando notas dissonantes a um ataque da percussão e resvalando para algo cortante. O som é puro Ribot. "Body and Soul" é executado da mesma forma, mas tocado com toque mais convencional da guitarra. Num momento, as cordas parecem balançar e, no outro, o som é uma reminiscência de Django.
Nada é tão suave nessas gravações -até mesmo as mais leves passagens são feitas com uma certa força. "Solitude" é um anti-Joe Pass. A canção é tocada com determinação, com figuras balançando entre as notas altas e baixas, mas sempre em uma justaposição equilibrada. "Dinah" é recriado com um suingado "puxão" das cordas, referência a uma versão de Monk.
Mas não há em sua técnica de guitarra -ou nessa sua homenagem a Thelonius Monk- resultado mais certeiro do que em "The Foolish Things". Sua guitarra não parece ter apenas seis cordas, mas as duas metades de um piano, as notas altas e as notas baixas.
Suas frases são muitas vezes figuras cromáticas que vão de um extremo a outro, e sua dinâmica é fundada nos extremos entre o grave e o agudo. Outro contraste que usa é entre o elétrico e o acústico.
Uma de suas melhores performances é em "Ghosts", de Albert Ayler. "Spigot", um original, é baseado quase inteiramente no dar e tomar entre duas notas sobre duas cordas. "Bouncin Around" revela suas raízes rock'n'roll, em que inicia com as notas graves de Duanne Eddy e termina com a "Marcha Fúnebre" de Chopin -única referência à morte em um disco de uma atraente graça.

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