São Paulo, quarta-feira, 29 de maio de 1996
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Premiê diz que terá voto dos religiosos

DO "HA'ARETZ"/"WORLD MEDIA"

Desde o debate na televisão, Shimon Peres só dormiu três horas. Durante a madrugada, leu o livro da neta de Yitzhak Rabin, Noah Ben Artzi. "É um livro interessante", afirma. Recusa-se a nos mostrar a dedicatória que a jovem autora lhe escreveu e tampouco quer falar dos muitos telefonemas que recebeu em casa depois do debate. "Eu não estava em casa", diz ele. "Foi Sonia, minha mulher, quem atendeu o telefone. Uma das ligações era de Henry Kissinger, outra de Helmut Kohl. Minhas relações com os chefes de Estado nunca estiveram tão boas."
Os jornalistas lhe perguntam: "O sr. acha que isso vai ajudá-lo?".
Shimon Peres - Embora ache que os israelenses respeitam as opiniões dos grandes do mundo, estou convencido de que se o resultado for o contrário, a eleição de "Bibi" Netanyahu acarretará o fim do processo de paz.
Pergunta - O sr. disse o mesmo em relação a Menachem Begin.
Peres - Em primeiro lugar, havia Anuar Sadat; depois, Begin reuniu em seu governo Moshe Dayan, Ezer Weizman e Yigal Yadin. Hoje, todos conhecem os colaboradores de Binyamin Netanyahu. Pergunta - O sr. já pensou na possibilidade de ser derrotado?
Peres - Não sejam céticos e cínicos. Vocês vêem meu estado de espírito. Tenho projetos precisos para os próximos quatro anos.
Pergunta - Em sua opinião, por que os partidos religiosos decidiram apoiar seu concorrente?
Peres - Não existe razão nenhuma para preferirem meu rival. Estou convencido de que muitos religiosos votarão em mim.
Pergunta - O sr. está decepcionado com a atitude deles?
Peres - Não, não estou. São eles que estão mais decepcionados. Antigamente eles se ocupavam exclusivamente de assuntos religiosos. Hoje em dia estão voltados essencialmente à política, se tornaram nacionalistas apenas. Em lugar de unir o povo, eles o dividem.
Pergunta - As últimas sondagens mostram que a diferença entre o sr. e Netanyahu se reduziu.
Peres - Foram os atentados que provocaram essa redução da diferença. Ele baseou sua campanha inteira no medo e no terror. Que patriotismo é esse?
Pergunta - O que o sr. sentiu diante das declarações dele?
Peres - Durante o debate inteiro eu mal podia crer no que estava ouvindo. Uma pessoa sem ideologia, que propõe uma paz sem conversar com Arafat e Assad; que propõe uma guerra contra o terrorismo, parando o processo de paz.
Houve outras coisas também que me chocaram. Ele propõe autonomia para os palestinos. Será que não sabe em que pé eles já se encontram? É elementar!
Pergunta - É verdade que o sr. estudou a possibilidade de uma autonomia municipal para os 160 mil palestinos de Jerusalém?
Peres - Nunca discutimos a partilha de um município. Nós nos concentramos na seguinte questão: "Deve-se ou não dividir Jerusalém?". Decidimos que não. Clinton e o rei Hussein estão de acordo. A prova disso é que tiramos Jerusalém da pauta atual das negociações sobre a autonomia.
Pergunta - O Likud continua a afirmar que os trabalhistas querem dividir Jerusalém.
Peres - É mentira! Eles venderam Jerusalém em troca de um punhado de votos. Se vocês checarem os discursos que fiz desde 1947, não encontrarão nenhuma alusão a qualquer partilha da cidade.
Pergunta - Quando o sr. era o número dois de Yitzhak Rabin, tinha mais audácia.
Peres - Após o assassinato de Rabin, fui eu quem decidiu continuar o processo de transferência do controle de seis cidades à autoridade palestina. A verdadeira ameaça, para nós, não vem de Binyamin Netanyahu, e sim do Irã fundamentalista.
Depois dos atentados as pessoas acharam que eu iria desmoronar. Se eu não tivesse travado uma luta implacável contra o terrorismo, teria perdido essas eleições. Durante todo esse período tive de lutar contra várias tentativas de acabar com o processo de paz. Isso também é uma batalha pela paz. Foi a maior das batalhas pela paz.
Pergunta - O sr. disse que as colônias continuarão em seu lugar?
Peres - Nem todos permanecerão sob a soberania de Israel. Eu disse que a maioria dos colonos vai permanecer sob nossa soberania.
Pergunta - O Partido Trabalhista até hoje não utilizou o assassinato de Yitzhak Rabin em sua campanha. O sr. cedeu à direita?
Peres - Teríamos sido criticados por fazer um uso cínico disso.
Pergunta - O sr. já se candidatou quatro vezes sem sucesso.
Peres - Foi sempre o partido que cometeu o erro de separar-se do Partido Nacional, religioso, fato que levou à aliança entre religiosos e nacionalistas.
Pergunta - Se o sr. vencer a eleição, o Likud o acusará de haver se beneficiado do voto árabe.
Peres - O que o Likud propõe? Que recusemos o direito do voto aos árabes israelenses. Mesmo Yigal Amir tem direito ao voto. É um escândalo, numa democracia, negar a uma parte do público o direito elementar ao voto, devido a sua origem nacional. O povo judeu sempre se revoltou contra tal ato.
Pergunta - E sua saúde?
Peres - Estou me sentindo perfeitamente bem. Meu avô morreu aos 96 anos -mas é melhor eu não dizer mais nada, porque isso poderia deixar certas pessoas inquietas.

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