São Paulo, sexta-feira, 31 de maio de 1996
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Morto travesti que cuidava de aidéticos

DA REPORTAGEM LOCAL

O travesti Cícero Caetano Leonardo, 48, conhecido como Brenda Lee, foi encontrado morto a tiros na madrugada de anteontem na serra da Cantareira (zona norte de São Paulo).
Brenda mantinha a Casa de Apoio Brenda Lee, que cuidava de doentes de Aids. A instituição abrigava atualmente 27 pacientes.
A polícia suspeita de crime por vingança. Na segunda-feira à tarde, Brenda havia dado queixa à polícia de que um cheque emitido por ela teria sido adulterado, supostamente por seu ex-contador, conhecido por Israel.
Sem documentos
O corpo de Brenda foi encontrado no km 19,5 da avenida Sezefredo Fagundes, na divisa de São Paulo e Mairiporã, por uma pessoa que passava pelo local.
O travesti foi morto com um tiro no peito e abandonado, de bruços, em um matagal. Estava sem documentos e sem dinheiro. O corpo só foi reconhecido na noite de anteontem.
Segundo os funcionários da casa de apoio, Brenda teria saído de casa na segunda-feira à noite, após receber um telefonema, dizendo que voltaria logo.
Como não voltou, moradores da casa avisaram a polícia do sumiço de Brenda. Na terça de manhã, seu carro, um Escort branco conversível, foi encontrado abandonado na rua Pedroso, no centro.
Dentro do carro havia algumas manchas, que a polícia acredita ser de sangue, e um furo de bala no estofamento do banco de trás. Um pente de balas de pistola 765, de propriedade de Brenda Lee, também foi deixado dentro do carro. A arma sumiu.
Fechamento
O clima ontem no velório de Brenda era de revolta e apreensão. Os pacientes da casa de apoio têm medo de que, com a morte dela, o local vá fechar.
Segundo o coordenador de Programa de Aids da Secretaria de Estado da Saúde, Paulo Roberto Teixeira, se a casa for fechada, os pacientes serão transferidos para outros centros de apoio. A casa recebia uma ajuda mensal de R$ 15 mil da secretaria.
O travesti Aline, 26, que está na casa de apoio há 16 dias, se disse temeroso de um possível fechamento da casa. "Ela era como uma mãe para nós. Vai fazer muita falta", declarou.
O médico infectologista Rogério Scapini, 38, vice-presidente da Casa de Apoio Brenda Lee, disse que vai lutar para que a instituição continue funcionando. "Mas, se não for para manter a qualidade que ela tinha, é bobagem", disse.
"Se a casa fechar, estaremos totalmente abandonados", disse José Roberto Gomes de Araújo, 36, conhecido como Pinah, que mora há seis anos na casa de apoio mantida por Brenda Lee.
A casa onde funciona a instituição estava registrada em nome de Brenda Lee. A família ainda não sabe o que vai fazer com ela.
"Ainda não paramos para pensar nisso", afirmou Valter Leonardo Silva, 54, um dos 17 irmãos de Brenda Lee.

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