São Paulo, sábado, 1 de junho de 1996
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Tomando o pulso do mundo

RUBENS RICUPERO

No fim do ano passado, o panorama econômico mundial era nebuloso e incerto. As greves francesas, a desaceleração da atividade na Alemanha, o desemprego assustador na Europa projetavam uma sombra escura de temor e insegurança.
Percorrida já quase metade do percurso neste ano, é tempo talvez de lançar um olhar novo às nuvens do céu econômico para ver se elas mudaram de cor ou de forma.
A resposta é sim e não; um céu não de brigadeiro, mas com nuvens entremeadas com algumas amplas áreas de luz.
Comecemos pelas sombras. A Alemanha confirmou, pelo segundo trimestre consecutivo, que está de fato em recessão. O desemprego em toda a Europa resiste teimosamente a todos os remédios. Na França, pensa-se agora em tentar a terapêutica de cortar o número de horas de trabalho, para ver se assim se consegue gerar emprego.
A OCDE (Organização para a Cooperação Econômica e o Desenvolvimento), que reúne as 27 nações mais avançadas, teve de rever para baixo a previsão de crescimento dessas economias, o que já fizera pela primeira vez em dezembro passado.
Desta vez, ela está prevendo um expansão neste ano de 2,1% (em lugar de 2,6% em dezembro), aumentando para 2,5% no ano próximo (em lugar da anterior previsão de 2,8%).
Dentre os gigantes da economia mundial, a Alemanha deve crescer apenas 0,5% em 96, acelerando para 2,4% em 97; os EUA, 2,3% em 96 e 2% em 97; e o Japão, 2,2% e 2,4%, respectivamente.
Essas estimativas coincidem, em linhas gerais, com as conclusões de uma recente reunião em Nova York dos participantes do sistema Link, grupo que reúne as diversas organizações internacionais que se esforçam em preparar prognósticos sobre o comportamento futuro da economia mundial (a Unctad, o Banco Mundial, o FMI, a OCDE, a ONU etc.).
O consenso nessa reunião foi no sentido de que a economia global deverá passar de um crescimento de 2,3% em 1995 para 2,8% e 3,3%, respectivamente, em 1996 e 1997.
Os países em desenvolvimento continuariam, em conjunto, a acelerar seu crescimento, de 5,1% em 95 para 5,4% em 96 e 5,9% em 97 -expandindo-se, portanto, a uma taxa que é o dobro da dos industrializados e fornecendo o impulso dinâmico que estes últimos têm se revelado incapazes de oferecer.
A parte do leão desse crescimento corresponderá, como vem ocorrendo até agora, à China, com 8,9% (1996) e 8,4% (1997), e às economias do Leste e do Sul da Ásia, com 6,6% e 6,7%, respectivamente. Na América Latina, a expansão deve passar de 1,3% em 1995 para 2,7% (1996) e 4,6% (1997).
Em meio a essas áreas de luz e esperança, as zonas de inquietação e perigo continuam a ser a volatilidade financeira e a ausência de crescimento em algumas economias de países ex-socialistas em transição e na África.
A inflação deve permanecer reduzida, tanto nos países industrializados como nas nações em desenvolvimento.
O desemprego, porém, se manterá em níveis inaceitáveis na Europa Ocidental e se estabilizará nos 27 países da OCDE, nos dois próximos anos, em torno de 7,7%, devido ao crescimento anêmico dessas economias.
O volume do comércio mundial deve crescer 7,7% em 1996 e 6,4% em 1997, após uma expansão calculada em 9,9% no ano passado.
1ª) A recuperação nas economias desenvolvidas continua em um ritmo moderado, mas constante e sincronizado;
2ª) espera-se que a inflação mundial permaneça baixa, sem necessidade, portanto, de apertos monetários;
3ª) as taxas de juros em termos reais estão baixas, comparadas às tendências dos últimos dez a 15 anos (não entre nós, é claro);
4ª) o comércio mundial continuará a crescer a taxas satisfatórias;
5ª) os fluxos financeiros para os países em desenvolvimento parecem haver superado a síndrome da crise mexicana;
6ª) a tendência para o preço do petróleo em termos reais é de redução adicional.
Em conclusão, não nos ameaçam no horizonte crises internacionais como as que torpedearam nosso desenvolvimento de meados a fins da década de 70 (os choques do petróleo) e no início da década de 80 (a crise da dívida).
Crescer ou não, com estabilidade ou recaídas nos vícios do passado, dependerá não do mundo, mas de nós mesmos.

Rubens Ricupero, 58, secretário-geral da Unctad (Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento) e ex-ministro da Fazenda (governo Itamar Franco), escreve aos sábados nesta coluna.

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