São Paulo, sábado, 1 de junho de 1996
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Camurati vai redescobrir o Brasil

Diretora quer recontar história

LUIZ CAVERSAN
DIRETOR DA SUCURSAL DO RIO

Recontar a história do Brasil desde o tempo em que o país era a "nova terra nova", conforme o relato de Pero Vaz de Caminha, até o começo deste século.
Este o megaprojeto de Carla Camurati, a diretora do polêmico e bem-sucedido "Carlota Joaquina, Princeza do Brasil". Ela quer, em seu novo filme, contar de novo da história do Brasil, mas não a partir dos eventos históricos, e sim do ponto de vista dos estrangeiros que aqui estiveram, "trabalhando, estudando ou roubando".
Depois que "Carlota" emplacou, Camurati anunciou que seu segundo longa seria sobre o bairro carioca de Copacabana.
Mas a reconstituição histórico-dramática do país -que deverá consumir um orçamento de R$ 1,2 milhão e ficar pronta no próximo ano- acabou por seduzi-la.
"Eu já pensava nisso antes mesmo de fazer 'Carlota'. Eu achava muito legal a carta do Pero Vaz de Caminha, que via os índios de uma maneira sem preconceitos."
O ato da chegada na nova terra nova, no entanto, era pouco para o filme que queria fazer. Por isso, ela procurou outros autores e passou a acompanhar a exploração geográfica do país por textos de estrangeiros que para cá vieram.
O filme não será um épico, adverte Camurati. "Será teatral, com elipses de tempo que me permitam contar muitas histórias em épocas e com personagens diferentes."
Ela ainda não sabe quantos episódios terá, mas pretende acompanhar os ciclos econômicos vividos pelo país em seus cinco séculos de existência, porque foram justamente com os ciclos (ouro, café, borracha etc.) que os estrangeiros vieram para cá, viram e relataram a seu modo o que encontraram.
Muitas nações
A chegada da esquadra portuguesa, registrada por Caminha, será uma espécie de prólogo do filme. Ela pretende registrar, principalmente, que não havia aqui apenas "um bando de selvagens pelados; eram nações inteiras, inúmeras, com culturas distintas".
Depois disso, as histórias se sucederão sempre num tom bem-humorado. "Não é preciso ser sério para relatar a História. Pode-se fazer isso de uma maneira divertida."
Ao reconstituir na tela o "descobrimento geográfico e pitoresco do Brasil", Camurati não objetiva fazer qualquer tipo de "drama ou denúncia". Mas admite que o filme mostrará "as injustiças sociais e econômicas".
Para tanto, ela diz que não abre mão do rigor histórico, mas dispensa "a pompa e a falsidade que normalmente são utilizadas para valorizar a nossa história".
A diretora acredita que seu filme vai se assemelhar a uma grande história em quadrinhos, com mudanças de cenários, épocas e personagens, que possibilitarão aos brasileiros contemporâneos uma observação aguda de suas raízes. "Cada um chegará às suas próprias conclusões."
Visão do colonizador
O fato de se basear em relatos de estrangeiros não dará ao filme um tom colonizador, acredita Camurati. Para ela, "a visão que o estrangeiro tem da gente permite que nos vejamos melhor. Se a visão for colonizadora e distorcida, a gente corrige".
Carla Camurati está entusiasmada com as pesquisas históricas. "É incrível poder ver o tempo em que os brasileiros não existiam. É muito legal observar o choque cultural entre os índios, os brancos e os negros. É a formação da mistura que deu origem à unidade nacional."
A diretora tem um objetivo além de recontar o passado: "A partir do momento que conhece a história, você pode mudar o presente e o futuro. O Brasil é acusado de ser um país sem memória. Ele tem sim, nós é que não cultivamos a memória. Pretendo fazer isso de uma forma lúdica, sem raiva ou ressentimento".

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