São Paulo, domingo, 2 de junho de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O retorno

OSIRIS LOPES FILHO

A novidade no governo federal é a troca de ministro. De resto, tudo continua na mesma. Empresas quebrando, desemprego aumentando...
Entre uma desgraça e outra, o presidente FHC vai fazendo nova viagem, agora inovatória, pois adquiriu caráter familiar. Carrega mulher, filha e netos e assume publicamente a sua condição: flanar pela "rive gauche" parisiense.
Está-se sedimentando uma velha constatação. O governo FHC constitui real continuidade do governo Collor. A identidade não é apenas de linha política. Cada vez mais é de protagonistas. Sai Serra, entra Kandir, famoso por integrar a equipe de Collor, como um dos idealizadores do fantástico confisco da poupança. Só falta em cena alguém no papel do PC Farias.
Interessante a trajetória de Antonio Kandir. De capador da poupança popular, deu-se-lhe agora a missão de castrar os gastos públicos.
No seu artigo, publicado na Folha do último domingo, sob o título "ICMS para competir", Kandir evidencia dois traços marcantes: o pragmatismo de sepultar a reforma tributária apresentada pelo governo federal e a postura tecnocrática tradicional de desrespeito à Constituição.
Mas há méritos na sua proposta. A viabilização da mudança do ICMS por lei complementar, potencializando a disciplinação prevista na Constituição de 1988, é excelente, principalmente quando prevê a consagração plena da não-cumulatividade do ICMS, ao possibilitar o crédito do imposto incidente sobre as máquinas e equipamentos que vão compor o ativo fixo das empresas. Beneficia-se o investimento e a modernização das empresas, cujo resultado final será o barateamento dos preços para o povo.
O desapreço à Constituição se manifesta quando pretende estabelecer a não-incidência do ICMS sobre o que denomina "esdrúxula figura do produto semi-elaborado". Para tanto há que se revogar o art. 155, parágrafo 2º, item X, alínea "a" da Constituição, na parte em que se excluem da imunidade do ICMS os produtos semi-elaborados. E se agrava quando postula a incidência do ICMS sobre importações de pessoa física, para consumo próprio. Não basta lei complementar. Há que se mudar todo o ICMS e os conceitos constitucionais de mercadoria e estabelecimento.
Boa sorte ao novo ministro. Que consiga fazer o principal. Reduzir gastos públicos efetivamente, sem perseguição aos servidores, bodes expiatórios do oportunismo e incompetência governamental.

Osiris de Azevedo Lopes Filho, 56, advogado, é professor de Direito Tributário e Financeiro da Universidade de Brasília e ex-secretário da Receita Federal.

Texto Anterior: Dimensões da crise econômica
Próximo Texto: Economia dá rumo do Oriente Médio
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.