São Paulo, domingo, 2 de junho de 1996 |
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"Expansão" de grupos de riscos desvia pesquisas
CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
Na prática, ela acabou provocando a alocação de boa parte dos escassos recursos de combate à Aids em pesquisa e tratamento entre grupos sociais que têm chances muito pequenas de se contaminar. Quando a Aids foi identificada, há cerca de 20 anos, a mídia a classificou como enfermidade exclusiva de homossexuais. A luta para mostrar que qualquer um está sujeito ao risco tinha o objetivo de não estigmatizar ainda mais um grupo já bastante marginalizado. Mas a evidência científica mostra que as chances de uma pessoa se infectar ao praticar sexo vaginal com um parceiro contaminado são de 1 para 1.000. No caso de intercurso anal receptivo, as chances vão de 5 a 30 para cada 1.000 atos. Nem as pessoas que usam agulhas infectadas para injetar drogas intravenosas correm tanto risco quanto os praticantes de sodomia: ocorrem de 10 a 20 infecções para cada 1.000 utilizações de agulha infectada. Transfusões de sangue podem provocar 1 infecção para cada 450 mil doações. Todos esses dados são do Centro de Controle de Doenças dos EUA, o mais confiável instituto de estudo da disseminação do HIV no mundo, e estão livres de "contaminação ideológica". Embora os novos casos de Aids registrados tenham participação menor de homossexuais do que no passado, 83% de todos os registros da doença nos EUA são de homossexuais ou usuários de drogas. No entanto, o governo federal não aloca recursos específicos para programas de prevenção da doença entre homossexuais. Devido à ação de deputados conservadores, ele também está proibido de ajudar programas de troca de agulhas para viciados, embora em diversas cidades eles tenham ajudado a conter a propagação do vírus. Cerca de 80% dos US$ 584 milhões usados pelo Centro de Controle de Doenças para tratar da Aids vão para programas de combate à doença entre mulheres heterossexuais, hemofílicos e outros grupos com menores riscos. Apesar da irracionalidade dessa política (não se pode esperar que a epidemia diminua se não for atacada nos grupos onde mais se propaga), ela se mantém devido ao maior poder de pressão de mulheres, estudantes universitários e outros segmentos heterossexuais. Casos raros, pela sua própria raridade, tendem a atrair mais a atenção dos meios de comunicação do que casos comuns. Assim, Kimberly Bergalis, a moça que contraiu HIV durante tratamento dentário, e Ryan White, o menino que se infectou numa transfusão de sangue, viraram personalidades públicas. Suas tragédias despertaram simpatia generalizada e provocaram o investimento em pesquisas para evitar que elas se repetissem, embora as chances de que isso ocorresse fossem pequenas. (CELS) Texto Anterior: Vírus HIV não provoca Aids, diz professor Próximo Texto: TRECHOS Índice |
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