São Paulo, domingo, 2 de junho de 1996
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A METAMORFOSE

Passado o impacto do anúncio da candidatura de José Serra à prefeitura paulistana, inicia-se uma nova fase. A partir de agora o Serra técnico da equipe econômica, metamorfoseado em candidato, assume nova dimensão na vida pública.
O primeiro desafio do candidato é conseguir criar uma imagem à sua semelhança e não um produto das críticas que já se anunciam. Seus adversários prometem "federalizar" o debate eleitoral. Esse é portanto um primeiro divisor de águas (federalização x municipalização). E também uma primeira armadilha.
Mas não se pode agora prejulgar a quem, de fato, a armadilha será danosa. Como integrante da equipe que nos últimos meses gerenciou o Plano Real, Serra tem a seu favor o apoio que a população vem dando, inegavelmente, à estabilização.
Mas José Serra não integrou a primeira equipe do Real. Foi sempre um crítico da valorização cambial, dos riscos de desindustrialização e do aumento do desemprego. "Federalizar", portanto, pode até ser uma armadilha fatal para os críticos, não necessariamente para o acusado.
O fato é que a trajetória do militante Serra pautou-se por circunstâncias quase sempre adversas. Como FHC, ele é parte de uma geração que chegou ao poder apenas depois de ter sido alijada do sistema político. O seu sucesso posterior identifica-se com o sucesso da experiência de democratização brasileira.
Ao mesmo tempo, a conquista do poder trouxe também custos ao professor que havia se destacado na denúncia da opressão política e da desigualdade econômica. Como todos os indivíduos em todos os partidos que desejam mudar o sistema "por dentro", Serra também foi obrigado a aceitar que o sistema o moldasse, condicionando seus atos e sonhos.
Do militante estudantil ao coordenador sabidamente obsessivo de equipes técnicas em vários níveis de governo, do exilado político ao senador eleito por uma massa acachapante de votos, do economista cepalino e desenvolvimentista ao gerente contrariado de uma estabilização que adia o crescimento, Serra sem dúvida firmou-se no cenário brasileiro como uma das mais vibrantes e provocativas figuras da política.
Tudo isso apenas agiganta o desafio da eleição municipal e lhe impõe, de um dia para o outro, o sacrifício de uma nova metamorfose.

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