São Paulo, quinta-feira, 6 de junho de 1996
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O caso Anhanguera

LUÍS NASSIF

Faria bem o governador Mário Covas em analisar melhor a licitação para a privatização do complexo Anhanguera-Bandeirantes. Pode ser melhor para o Estado e para a própria licitação.
O edital prevê a competição pelo pagamento dos serviços. Quem pagar mais pela concessão leva.
Na fase preliminar, o edital define critérios técnicos, nos quais todos devem se basear para fundamentar a proposta financeira.
Os concorrentes deveriam montar um fluxo de caixa, tendo por base as tarifas do pedágio, custos operacionais e investimentos.
Com base no fluxo, definiriam uma quantia factível, que poderia ser paga ao governo estadual pela concessão da rodovia.
Os problemas surgiram na hora de definir o valor do pedágio. O pedágio será reajustado em julho próximo. As propostas foram apresentadas em março.
A maneira financeiramente correta de montar o fluxo seria calcular as despesas de acordo com os valores de março. Depois, atualizar o valor do pedágio até março "pro rata", aplicando uma correção "pro rata".
Com base nesses critérios, se estimaria o fluxo de resultados e se faria a proposta de pagamento ao Estado. Em pelo menos dois tópicos o edital é claro nessa direção, inclusive no capítulo que responde a dúvidas dos participantes.
Curiosamente, na abertura das propostas técnicas sete dentre os oito consórcios classificados optaram por uma interpretação que prejudica o Estado:
1) Calcularam as despesas de acordo com valores de março.
2) Calcularam as receitas do pedágio de acordo com os preços de julho de 95.
Se o valor do pedágio está subestimado, é óbvio que o valor a ser oferecido ao Estado pelos participantes será menor.
Punição
Mesmo assim, o consórcio que fez o cálculo correto foi desclassificado porque, segundo o próprio governador Mário Covas, a forma de cálculo lhe permitiria oferecer mais pela concessão do que os concorrentes. E daí? Desde quando receber mais é ruim?
O consórcio desclassificado tem contra si o fato de ser constituído por empresas com passado polêmico em São Paulo -entre elas, as notórias Andrade Gutierrez e CBPO.
Mas, se se quiser puni-las, acione-se o Ministério Público. E há muitos temas controversos à espera de uma apuração e, se possível, da abertura de inquéritos sobre eles.
O que não pode é a punição ser feita à custa de claro prejuízo para o Estado. Mesmo porque são amplas as possibilidades de a licitação ser barrada na Justiça.
O mais correto, a esta altura, é reabrir a licitação, uniformizar os critérios e decidir pela proposta que represente maior vantagem para o Estado.
Jornalista
Em pleno 1986, o colunista se empenhou em uma "guerra santa" contra o governo Sarney, especialmente contra o todo-poderoso consultor da República, Saulo Ramos, por alterações no segundo decreto do Cruzado, que ressuscitavam a indústria das liquidações extrajudiciais e das concordatas.
No início, apenas a Folha encarou a briga. Depois, a "Senhor", de Mino Carta. Todo o restante estava embalado pelo clima de ufanismo do Cruzado, criando barreira intransponível para críticas.
O colunista procurou, então, Júlio de Mesquita Neto -falecido ontem- para tentar sensibilizá-lo sobre o tema.
Ao saber dos detalhes da história, Mesquita interessou-se vivamente. Só que o "Estadão" passava por fase complicada e não dispunha de repórteres que pudessem perseguir os fatos mencionados.
Júlio Neto não relutou. No domingo seguinte, o "Estado" publicou -"a pedidos"-, na página 4, a íntegra da entrevista feita por outra publicação (a "Senhor"), na qual o colunista de um jornal competidor fazia suas denúncias.
Fica o registro, em respeito a um grande jornalista.

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