São Paulo, sexta-feira, 7 de junho de 1996
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O imbróglio Mendes Jr.

CELSO PINTO

Mesmo que a bancada mineira inclua a autorização para o Tesouro honrar até R$ 900 milhões em débitos para a Mendes Jr. na MP que aumenta o capital do Banco do Brasil, o caso não deve ter nem solução rápida, nem simples.
Murilo Mendes, dono da empreiteira, ainda tem esperança na inclusão da emenda e diz haver uma promessa da Presidência de não vetá-la. O presidente do BB, Paulo Cesar Ximenes, não acredita que esta alternativa seja viável. E lembra que, mesmo que ela seja aprovada, não quer dizer que a discussão se encerrou, apenas que a responsabilidade final passaria do Judiciário para o Executivo.
Se houver a emenda e o presidente não vetá-la, ainda assim caberia discutir quem deve o que a quem, segundo Ximenes. Autorizar o Tesouro a pagar não quer dizer que ele é obrigado a fazê-lo sem discutir quem tem razão. E essa é a essência do imbróglio que se arrasta desde os anos 80.
Simplificadamente, a Mendes Jr. se acha credora de cerca de US$ 450 milhões, no valor original, que eram débitos do Iraque à construtora. A Mendes Jr. paralisou obras que fazia no Iraque em dezembro de 87, em função da guerra Irã-Iraque, e tentou cobrar seu crédito na Corte Internacional de Paris.
O governo brasileiro, interessado em assegurar fornecimento de petróleo iraquiano em troca de exportações brasileiras, convenceu a Mendes Jr. a voltar ao Iraque. A Mendes retirou a queixa e, em troca, assinou um contrato de cessão de crédito com o Banco do Brasil, no qual repassava a dívida iraquiana de US$ 450 milhões. Ao mesmo tempo, reconhecia um débito seu ao BB de cerca de US$ 220 milhões.
O que a Mendes quer, agora, é a diferença, corrigida, entre estas duas quantias. Algo que Murilo Mendes calcula em mais de US$ 400 milhões. É isso, não R$ 900 milhões, o que está em jogo do lado da Mendes. O BB, por sua vez, não reconhece que o contrato de cessão tenha sido consumado, diz Ximenes, porque algumas condicionalidades não foram preenchidas (por exemplo, o reconhecimento da dívida pelo Iraque). Calcula que, somando tudo, a Mendes deva a ele mais de R$ 900 milhões. A dívida, a rigor, não é do BB, mas do Tesouro, mas isso não ficou claro quando foi feito o contrato de cessão de crédito. O BB responde pelo caso e, segundo Ximenes, já se provisionou em US$ 400 milhões para cobrir eventuais perdas.
O caso tramitou anos no governo e um grupo interministerial, em 92, acabou concluindo, basicamente, em favor da Mendes Jr. Só que, depois disso, diz Ximenes, pareceres da Procuradoria Geral da Fazenda constestaram as conclusões do grupo interministerial, concluíram que o contrato não se consumou e que, portanto, o BB tinha que cobrar todo o débito da Mendes Jr..
Com base nesse parecer, o BB abriu um processo em Minas contra a Mendes Jr., que está na fase conclusiva. Murilo Mendes acha que ganhará este processo. Ximenes diz que, se isso acontecer, o BB recorrerá a todas as instâncias superiores a que tem direito. Murilo Mendes, por sua vez, garante que, se a solução via MP não se concretizar, abrirá um processo contra o BB em Nova York.
Parte do litígio é uma operação de "sale and lease back", de 86, dos equipamentos que a construtora tinha no Iraque (o BB os comprou e os arrendou à Mendes). Os equipamentos foram perdidos com a Guerra do Golfo, mas tinham um seguro, feito pelo Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), cobrindo, inclusive, risco de guerra.
O IRB alega, contudo, que antes de a guerra estourar a Mendes Jr. já estava inadimplente, o que obrigaria o BB a cobrar o dinheiro da construtora. A Mendes nega e diz que a responsabilidade é do IRB. Se o BB perder num processo contra a Mendes, explica Ximenes, seu passo seguinte será cobrar o dinheiro do IRB.
Ximenes reconhece que a Mendes Jr. tem alguns argumentos legais fortes em seu favor, mas vai brigar até o fim. No fundo, admite, tanto o BB quanto a Mendes aceitaram operar em nome do Tesouro e, pelo menos no caso do Iraque, se deram mal. A corrida, para a Mendes, é para tentar evitar a falência.

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