São Paulo, sábado, 8 de junho de 1996
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'De La Guarda' exorciza a chatice política

ELVIS CESAR BONASSA
ENVIADO ESPECIAL A LONDRINA (PR)

Os anos de regime militar deprimiram o teatro argentino. Para ficarem politizados, os espetáculos ficaram chatos, pesados, discursivos. O grupo "De La Guarda" é uma das principais reações a esse clima: aposta nas sensações antes de fitar a reflexão.
O espetáculo "Período Villa a Villa", que estreou na quarta-feira e fica até hoje no Festival Internacional de Londrina (PR), faz o palco subir aos ares. Os atores estão dependurados -voam sobre o público. Jogam com luz, fogo, água, balões de plástico, música quase tribal e muita velocidade.
"Decidimos apostar no tema festivo, em uma atmosfera enlouquecida, desenfreada, na qual as sensações cheguem ao público antes do pensamento", disse à Folha o diretor Diqui Jares.
As comparação com o catalão "La Fura del Baus" são inevitáveis. Mas Jares marca a diferença: "Nós não jogamos com o medo, tentamos mesmo esconder do público os riscos que corremos".
Uma estrutura de 15 metros de altura, 12 metros de fundo e 15 metros de largura, de canos metálicos pintados de amarelo, sustentam as evoluções aéreas dos atores. O formato lembra uma mesquita.
No início da apresentação, os espectadores estão encerrados em um cubículo feito de paredes e teto de papel ou lona, que escondem a estrutura metálica.
Por cima deles, silhuetas visíveis através do papel, os atores fazem evoluções. A luz e os elemento cênicos levam a supor o mar, visto por baixo.
Após alguns minutos, o papel começa a ser rompido, as paredes caem, as limitações explodem, ampliando os espaços.
São choques. Numa das cenas mais fortes, uma parede de lona é "demolida" com o uso do corpo de uma atriz. Dependurada em uma corda, ele é arremessada repetidas vezes, aos gritos, contra a lona, que aos poucos vai cedendo.
O grupo não recebe subvenção do Estado nem tem patrocinadores. "Período Villa a Villa", alusão a isso, pode ser traduzido como "de favela em favela". Mas o público e convites internacionais garantem sua continuidade.
"Já fizemos 80 espetáculos, sempre com público lotado. E gastamos apenas R$ 4 mil com mídia", afirma o diretor.
Após Londrina, o "De La Guarda" viaja à Europa. Apresenta-se, no segundo semestre, na Espanha, Iugoslávia, França e Alemanha.
Para o diretor, é o sucesso da aposta festiva. "O teatro na Argentina cresceu politicamente, mas não esteticamente. Nós queremos a beleza. A preocupação social não está no conteúdo do espetáculo, mas no que se passa com os espectadores lá dentro."

O jornalista ELVIS CESAR BONASSA viajou a convite da organização do Festival Internacional de Londrina

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