São Paulo, domingo, 9 de junho de 1996
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Em grande escala

JANIO DE FREITAS

Três anos e nove meses depois do impeachment, está entregue ao exame da Justiça o inquérito central sobre o esquema Collor-PC Farias, incluindo o que a CPI sabia, podia, devia, mas não quis fazer: a reunião orgânica dos elementos que demonstram a formação e a ação de uma quadrilha para explorar a administração pública, com a conivência lucrativa de muitos empresários e empresas, para obter enriquecimento ilícito em grande escala.
Convocado no Paraná para encarregar-se do inquérito, o delegado Paulo Lacerda esteve então sujeito à suspeita de que fora convocado por ser obscuro, sem anteparo político para defendê-lo de pressões e, sendo assim, passível de controles limitadores de sua ação e conclusões. De lá até hoje, não teve um só momento de estrelismo, nem consta que o tivesse de acovardamento ou de venalidade.
Pelo que se sabe até agora das quatro dezenas de volumes do inquérito central, complementados por 1.100 volumes de anexos, Paulo Lacerda lega à posteridade uma devassa que não servirá só à apreciação histórica do governo Collor. O que, no fundo, se documenta naqueles volumes são os valores morais e culturais da camada dominante da sociedade brasileira, as relações entre poder econômico e poder político, os sistemas de tomada de decisão em vários níveis. Relativos a um período em que tudo isso esteve exacerbado, é certo. Mas, além de por isso mesmo mais claro, também sem fugir à regra a não ser por algumas técnicas criminais.
A investigação dessas técnicas proporciona informações aproveitáveis, entre outras coisas, para melhor conhecimento público da contribuição do sistema bancário nas atividades lesivas ao país. Era por bancos legais que o esquema Collor-PC fazia sair e retornar, com aparência legal, a dinheirama ilegal. Operações utilizando não só contas "fantasmas", uma centena delas, mas também empresas "fantasmas" em vários países.
As empresas e empresários não alcançados pelos efeitos do impeachment e dos inquéritos-subsidiários, têm sua participação agora mais detalhada. E, se bem que a maioria dos nomes repita os encontrados pela CPI, há alguns acréscimos e, sobretudo, revelações que levaram ao indiciamento inevitável. O que faz supor maiores dificuldades para que as sentenças continuem levemente voltadas só para PC Farias.
Collor, pelas evidências da associação, e alguns empresários, pela comprovada participação em fraudulências diversas, são candidatos a dar aos brasileiros a sensação de que o inquérito não está, e o futuro processo judicial não estará, entre as fraudes de que tratem.

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