São Paulo, quinta-feira, 13 de junho de 1996
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Shopping assistiu ao inferno de Dante

DA REPORTAGEM LOCAL

Foi um espetáculo de pânico e horror o que aconteceu no interior do Osasco Plaza Shopping logo depois das 12h16 de terça-feira, quando parte do piso inchou como uma bolha e explodiu, espatifando paredes e vidraças, destruindo o teto, e provocando a morte de dezenas de pessoas.
"Cenas dantescas, pavorosas, corpos espalhados, sangue misturado a escombros, pessoas feridas, funcionários e consumidores abraçados pelo chão", descreve, em flashes cinematográficos, o empresário Ismael Menezes, que chegou ao prédio por volta das 12h20, com uma reunião agendada para as 12h30.
Assessor de comunicação do shopping, Menezes viu-se, repentinamente, no inferno: "No meio dos escombros, havia muitas pessoas vivas. Ouvi gritos de crianças chamando suas mães", conta. "Duvido que possa esquecer tudo isso algum dia".
Corriam como baratas
As cenas de terça-feira também permanecerão na memória do adolescente Paulo Marques Silvério Oliveira, 17.
Ele sentiu o banco de madeira em que descansava, na praça de alimentação, estremecer sob o impacto da explosão.
"A praça estava cheia quando tudo tremeu", diz. "Ouvi gritos. As pessoas começaram a correr, cada uma para um lado, como baratas", relata.
Assustado, Oliveira acabou entrando no frenesi da correria: "Fui na direção da primeira luz que vi".
Um ano mais velha, Rejane Dias Macedo, 18, retirava dinheiro de um caixa eletrônico, quando ouviu o estrondo.
Tentou correr, mas foi impedida por um pedaço de parede que desabou sobre suas costas. "Fiquei desesperada. Vi pernas e braços e uma criança que chorava".
Esqueceu a idade
Como ela, Adriana Merieli de Souza Fernandes, 15, que foi ao shopping comprar presente para seu namorado, também foi atingida pelos escombros.
"Só ouvi a explosão. Quando acordei estava embaixo de um monte de pedras e ferro".
Fernandes, como todos que ali estavam, foi testemunha de cenas terríveis: "Vi muita gente gritando e uma pessoa com a perna quebrada, um pedaço para cada lado", contou, na terça-feira, na enfermaria do Hospital Regional de Osasco, onde foi atendida.
Na mesma enfermaria, a aposentada Maria Miguel de Souza não conseguia, sob impacto da tragédia, dizer sua própria idade.
Uma senhora, possivelmente em torno dos 60 anos, Maria lembra-se de ter entrado numa loja para comprar uma blusa.
Foi quando ouviu o barulho. Uma viga de ferro caiu sobre sua cabeça: "Ficou tudo enterrado".
A cabeleireira Ana Maria de Sá Franco, 35, portuguesa, também encontrava-se numa loja, comprando incenso.
"Ouvi o barulho e me escondi debaixo do balcão. "Quando saí, não vi ninguém, só pedaços de pernas e braços".
Desesperada, ela começou a percorrer o shopping em busca de uma porta de saída. "Estavam todas fechadas", lembra-se.
"Naquela hora, pensei que fosse morrer. Só chorava e via pessoas feridas, com as cabeças quebradas. Lembro de ter visto um homem que estava com um osso à mostra. Até que, de repente, consegui escapar por uma parede quebrada."
Ontem, à tarde, Ana Maria tentava recuperar seus documentos, no 5º Distrito Policial de Osasco. "Naquela hora não ia me lembrar da bolsa."
Tempo parado
Foi exatamente quando escolhia uma bolsa, que a auxiliar de escritório Débora Helena Quirino da Graça, 20, viu-se em situação desesperadora. "Caí no chão desmaiada. Quando acordei, estava cercada por vigas e pedaços de cimento. Olhei para minha perna e tentei me mover. Mas meu pé continuou virado para o mesmo lado. Então percebi que tinha quebrado o tornozelo", lembra-se.
Graça tentou chamar uma amiga. Não obteve resposta. "Depois vi que ela estava se arrastando, toda suja. Desmaiei de novo e só acordei no hospital."
Para o empresário e assessor de imprensa Ismael Menezes, o período em que permaneceu entre as "cenas dantescas" que descreveu, perdeu-se do relógio.
"Tentei ajudar algumas pessoas, até que os bombeiros chegaram", conta. "Mas não sei dizer quanto tempo fiquei ali. Pode ter sido um ou 20 minutos. Foi como se o tempo tivesse parado. Ou se acelerado", diz.

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