São Paulo, sexta-feira, 14 de junho de 1996
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Comércio ainda cobra 582% ao ano

GABRIEL J. DE CARVALHO
DA REDAÇÃO

O comércio continua cobrando juros de até 17,35% ao mês, ou 582,02% ao ano, apesar de o IOF (imposto) ter sido reduzido e a taxa básica da economia, monitorada pelo Banco Central, estar em queda gradual.
Na média, os juros cobrados dos consumidores foram de 10,01% ao mês (214,19% ao ano) em maio, abaixo dos 10,61% de abril, "mas ainda absurdamente altos", diz Miguel José Ribeiro de Oliveira, vice-presidente da Anefac (Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade).
A entidade pesquisa juros com base em anúncios publicados em jornais de São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre. A maioria dos anúncios (58%) são de empresas pequenas ou médias.
A taxa média de 17,35% ao mês foi registrada em anúncios de lojas que vendem artigos de ginástica. A mais baixa, de 3,58% ao mês ou 52,51% ao ano, é praticada no comércio de veículos.
Este setor vem trabalhando com correção cambial (a prestação segue o dólar comercial, que tem deslizado cerca de 0,6% ao mês). Em outros ramos, os juros são prefixados (prestações fixas).
Oliveira, coordenador da pesquisa, diz que a queda dos juros na ponta das aplicações não está sendo acompanhada pelo crédito. Hoje, investidores de renda fixa obtêm, no máximo, cerca de 1,7% líquido ao mês, ou 22,42% ao ano. Poupança paga entre 1% e 1,2%.
Pouca informação
Além dos juros muito elevados, as lojas desrespeitam a legislação, pois 85% dos anúncios não informam em destaque a taxa cobrada, diz Oliveira. E 97% informam de forma não-clara ou ilegível.
Em outros casos, acrescenta, as empresas dizem que não cobram juros, mas eles estão embutidos nas prestações: "A promoção de três vezes sem juros é enganosa".
Atualmente, diz ele, cerca de 85% das vendas do comércio são a prazo e o consumidor não se preocupa tanto com os juros, e sim com o valor da prestação.
Para Oliveira, poucas vezes na história o comércio obteve tanto ganho financeiro.
Empresas que comercializam bens importados conseguem financiamento direto do exportador com prazo de seis meses e juros de 4% a 6% ao ano, mas não repassa isso para o cliente, diz o vice-presidente da Anefac.
Grandes empresas buscam crédito no exterior a 8% ou 10% ao ano. Médias empresas conseguem dinheiro a 30% ao ano, via resolução 63. Nos bancos nacionais, acrescenta, empresas descontam duplicatas a 4% ao mês.
Com os juros cobrados do consumidor, afirma Oliveira, as empresas conseguem ganhos de 400% ao ano, contra 20% se aplicarem reservas no mercado financeiro interno.
Onda de calotes
Oliveira prevê até aumento do nível já alto de inadimplência (falta de pagamento) porque a inflação anual esperada é de 12% e, supondo ganhos de produtividade de 5%, os salários subiriam 17%.
Instituições financeiras admitem que o crédito está hoje muito caro, mas atribuem este fato à chamada cunha fiscal (compulsórios) e, paradoxalmente, também à taxa de risco que embutem no custo final, para se prevenirem de calotes.
Cobram mais e, na média, bons pagadores compensam prejuízos com quem deixa de pagar. Em geral os juros são mais baixos no financiamento de bens de maior valor, como veículos, justamente porque aí a garantia é maior.

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