São Paulo, sábado, 15 de junho de 1996
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O Brasil é deles

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Raríssimas vezes, na conturbada história dos povos, houve tamanha unanimidade em torno do que deve ser feito para que o Brasil seja o país da prosperidade, da paz e da ventura pública. Em qualquer solenidade, missa em ação de graças, casamento de filhas de deputados, convescotes de fim-de-semana no Alvorada, simpósios entre empresários, colóquios entre donas-de-casa, todos os que chegam aos microfones da mídia falam a mesmíssima coisa: tudo está bem, só precisamos apressar as reformas. O Brasil não é mais nosso, é deles.
O comandante dessa unanimidade é o próprio presidente da República, cujo discurso cada vez fica mais parecido com o de um líder da oposição. Ele diz tudo o que todo mundo diz, mas é como se nada fosse com ele. Os juros são escorchantes, a saúde vive um descalabro, o desemprego é dramático, mas a culpa não é dele, é das estruturas arcaicas -da qual ele fez parte, até recentemente, ajudando a votar a Constituição de 1988.
Fruto da unanimidade, o governo está parado, só mostrando alguma organicidade na esfera adjetiva do poder: reuniões, visitas ao exterior, muita saliva gasta em articulações. Para mudar um ministro -coisa que JK fazia em meia hora de expediente- o governo cria um calvário para quem sai e para quem entra.
Dois casos para lembrar: a substituição de José Serra por Antonio Kandir -que causou uma crise de saúde para o novo ministro. E a fritura do ministro Jatene, o único que conseguiu, até agora, ter uma prioridade e jogar tudo em cima dela.
Não há pressa para atenuar o desemprego, o genocídio da saúde. Só se fala em pressa quando o assunto é reformar as tais estruturas arcaicas. E nem com a pressa, diariamente exigida e anunciada como a salvação da pátria, as reformas saíram da intenção e da esterilidade.

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