São Paulo, quinta-feira, 20 de junho de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A hora dos fundos sociais

LUÍS NASSIF

Não há mais por que protelar mudanças na privatização. O momento é adequado para o grande corte, capaz de viabilizar as privatizações, conferir-lhes legitimidade social e lançar as bases da implantação do verdadeiro capitalismo social no Brasil.
Há carência de moedas para privatização e de conteúdo social no discurso do governo.
A falta de legitimidade do governo emperrou as reformas constitucionais.
E o governo carece de uma bandeira capaz de significar um grande aceno em direção à nação, possibilitando ao presidente dispor de elementos para uma rearticulação do pacto nacional pelas reformas.
Sugerido há quatro anos, o modelo parte dos seguintes pressupostos.
Desde o início, pretendeu-se que o programa de privatização contribuísse para sanear passivos públicos.
No modelo inicial de privatização, ainda no governo Collor, reconheceu-se toda sorte de créditos contra a União: debêntures da Siderbrás, Títulos da Dívida Agrária e assim por diante -moedas que foram rapidamente adquiridas por especuladores de mercado, a valores baixos.
Mas não se reconheceram os créditos preferenciais: o endividamento público contra os chamados fundos sociais (FGTS, FAT e PIS).
Consequência: houve insuficiência de moedas, deprimindo os preços das empresas, e os benefícios da privatização ficaram concentrados em grupos financeiros, tirando grande parte da legitimação do programa.
Pior: os fundos sociais estão tecnicamente quebrados. Seus grandes devedores são Estados e municípios.
E os únicos ativos de que os governos dispõem para pagá-los são as estatais. Vendendo as estatais, sem quitar sua dívida com os fundos, não haverá maneira de evitar sua futura insolvência.
Modelo
Os grandes devedores dos fundos são Estados e municípios. A proposta original previa inicialmente um encontro de contas.
A União renegociaria essas dívidas de duas maneiras: ou em troca das estatais estaduais, ou em troca da garantia de parte do fluxo futuro das transferências constitucionais.
As dívidas seriam securitizadas e transformadas em moedas de privatização. Com essas moedas, Estados e municípios pagariam os fundos -que as utilizariam para entrar nos leilões de privatização.
O FGTS seria transformado de fundo de renda fixa, que remunera mal e porcamente seus beneficiários, em fundos de pensão, descentralizados e administrados pelos seus cotistas, garantindo a complementação da aposentadoria.
Uma segunda variação seria permitir a cotistas do FGTS optar por receber sua parte em moedas da privatização.
Nesse caso, as cotas teriam portabilidade. Isto é, os cotistas poderiam transferi-las para fundos constituídos para tal, em regime de competição.
Adesões
A proposta já recebeu o apoio formal de toda sorte de parlamentares, de petistas a luminares do PFL.
E já conquistou inúmeros corações e mentes de pessoas que hoje conduzem a economia.
Não há por que postergar essa saída. Hoje em dia, o próprio BNDES e a Caixa conduzem renegociações de dívidas estaduais em troca de estatais e de programas de ajustamento.
No plano financeiro, o governo já desenvolveu modelos de fundos abertos, aptos a administrar esses ativos.
No plano macroeconômico, a multiplicação do FGTS em vários fundos de pensão -dentro da reestruturação do setor- traria um impulso extraordinário ao segmento, valorizando os ativos de empresas privadas nacionais, que não ficariam tão expostas às incursões de capitais externos -que as estão adquirindo a preços de bananas.
Há alguma complexidade técnica nessa montagem. Mas vale a pena o núcleo duro do governo -composto por José Roberto Mendonça de Barros, Pedro Parente, Antonio Kandir, Chico Lopes e Luiz Carlos Mendonça de Barros- começar a desenvolver propostas nesse sentido.

Texto Anterior: México adianta pagamento de dívida
Próximo Texto: Agência dos EUA mantém 'risco' Brasil
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.