São Paulo, domingo, 23 de junho de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A hora e a vez das mudanças

LUIZ CARLOS SANTOS

Enganam-se aqueles que acreditam ter o governo desistido de aprovar as reformas constitucionais no Congresso Nacional. Elas continuam sendo importantes para o país e para o Plano Real e deverão ser votadas até o final deste ano. Se isso vai ocorrer antes, durante ou depois do recesso parlamentar, se as eleições municipais de 3 de outubro vão influenciar no ritmo das votações... Não são questões substanciais. Fazer previsões nesse sentido é mero exercício de futurologia e nada acrescenta à questão principal.
O fundamental para o país neste momento é garantir o sucesso do Plano Real, que está às vésperas de completar dois anos de existência plena de êxitos. Os jornais noticiaram na semana passada a queda na taxa de mortalidade infantil no Brasil em 28%, no primeiro trimestre deste ano em relação a igual período de 1995. O Ipea divulgou, recentemente, que 5 milhões de pessoas, em seis grandes capitais, atravessaram a linha de pobreza, no período de julho de 1994 a janeiro deste ano.
A inflação estabilizou-se em torno de 1% ao mês e deve fechar o ano entre 12% e 15%. São conquistas, como tantas outras dos últimos dois anos, obtidas a partir de uma política firme de estabilização da moeda e que não podem ser desprezadas em qualquer análise que se pretenda fazer sobre a realidade brasileira. O Plano Real não é um fim em si mesmo, todos nós sabemos disso, mas suas conquistas precisam ser preservadas e os objetivos a serem alcançados no futuro dependem da nossa capacidade de mudar uma estrutura arcaica, viciada, que tantos prejuízos já trouxe ao patrimônio público.
Um caminho seguido pelo governo, como alternativa para o modelo esgotado, foi o das reformas da ordem econômica, da Previdência, da administração do Estado e a tributária. No caso da Previdência, o objetivo principal é o de atacar todos os privilégios e aposentadorias especiais, como forma de reverter o quadro de deterioração a que chegou o sistema. Estamos caminhando, a passos acelerados, para uma situação em que o Estado não terá mais como garantir o pagamento dos benefícios, se mantidas as atuais regras. O déficit previsto para este ano, na Previdência, pode chegar a R$ 2,5 bilhões.
A reforma administrativa tem como objetivo principal enxugar a máquina estatal, de forma a permitir que os Estados, municípios e a própria União voltem a ter capacidade para investir em obras de infra-estrutura, como construção de escolas, hospitais, estradas, redes de saneamento básico etc. Novos empregos estarão sendo gerados a partir de investimentos em áreas que são verdadeiramente públicas.
Com a reforma tributária, que será colocada logo na pauta de votação da Câmara dos Deputados, o governo busca, fundamentalmente, um modelo tributário mais justo e que seja capaz de atender aos requisitos de simplificação, melhor distribuição da carga tributária (hoje, em torno de 28% do PIB), além de colocar um freio na guerra fiscal e reduzir a sonegação. O setor de exportação estará totalmente desobrigado de recolher o ICMS, o que hoje só ocorre para os produtos industrializados.
No capítulo da ordem econômica, depois de desconstitucionalizar temas importantes como a questão dos monopólios da Petrobrás, das telecomunicações, do gás canalizado, da navegação de cabotagem e do conceito de empresa nacional, os esforços estão concentrados na regulamentação dessas matérias. O governo está procurando acelerar a tramitação de projetos que regulamentam a telefonia celular, já aprovado na Câmara, e a navegação de cabotagem. Anteprojetos já estão prontos e deverão ser remetidos de imediato ao Congresso para disciplinar a participação de empresas privadas nas áreas de petróleo e de telefonia geral.
Outras matérias de cunho social estão tramitando no Poder Legislativo, como a emenda constitucional que cria um fundo de investimento para custear o ensino fundamental e que vai garantir melhorias inclusive salariais aos professores. A oposição, que tem defendido tantos privilégios na reforma da Previdência, votou contra essa matéria no plenário da Câmara, mas foi derrotada.
Na Comissão de Constituição e Justiça e de Redação, por ampla maioria, o governo conseguiu aprovar projeto de lei que dispõe sobre o rito sumário para desapropriação de imóveis para fins de reforma agrária. Ao mesmo tempo, o Executivo garantiu apoio ao projeto do deputado Odelmo Leão, líder do PPB, que facilita a contratação de mão-de-obra no campo e ajuda a reverter o êxodo rural.
Portanto a palavra está com o Congresso Nacional, que tem autonomia e capacidade para decidir. É falso afirmar que deputados e senadores nada decidem em ano eleitoral. Se isso fosse verdade, não teríamos aprovado o Plano Real em 1994, quando estavam sendo realizadas eleições em vários níveis, inclusive presidencial. O Poder Legislativo tem colaborado sistematicamente na busca de soluções para os problemas nacionais. Não faltará desta vez.

Texto Anterior: INEDITISMO; PODER LIMITADO
Próximo Texto: O comércio do terror
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.