São Paulo, domingo, 23 de junho de 1996
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O sabor do Beto Carrero World

MÔNICA RODRIGUES COSTA

Mistura de Zoológico, circo e atrações que provocam zonzeira estão ajudando a transformar o parque de diversões no maior centro de lazer do brasileiro da classe média
A surpresa ao entrar no escritório do artista e empresário Beto Carrero em São Paulo é ver nas paredes pinturas de Volpi, Tarsila do Amaral e Di Cavalcanti.
Os quadros contrastam com os previsíveis chapéu e jaquetas em estilo "country", pendurados no mancebo ao lado de sua mesa de trabalho.
"São autênticos", diz o caubói, com simplicidade. "Gosto dos grandes pintores, sou o segundo maior colecionador de João Câmara, tenho 46 obras dele", além de oito telas de Volpi e outras de Aldemir Martins. "Geralmente, comprava direto do Câmara, do Aldemir Martins, cheguei a comprar direto de Volpi."
Identidade
O nome real desse paulista de São José do Rio Preto é João Batista Sérgio Murad.
O "Carrero" nasceu de um carro de boi, por causa do pai, Alexandre Murad, libanês que imigrou para São Paulo.
"Eu mesmo dei o apelido. Meu pai era colono em uma fazenda e tinha carro de boi. Muita gente o chamava de 'Carrero' e a mim também. Primeiro, era Sérgio Carrero, depois ficou Beto, um nome fácil de lembrar."
Beto conta que herdou dos pais uma mistura boa, a calma da mãe mineira, Floripes, e a parte árabe, comercial, do pai.
Em Beirute, Alexandre Murad, trabalhava com cavalos e montava bem. "Meu pai tinha afinidade com os cavalos árabes. Sempre teve espírito de aventura, gostava de viajar. Conheceu minha mãe e ficou no Brasil. Tiveram 11 filhos, sete mulheres e quatro homens."
"Minha família era um exército. Imagine 13 pessoas dentro de casa, sentando à mesa para almoçar e jantar, uma minicidade. Nós tínhamos um relacionamento bom, nem brigávamos muito. Se um irmão tinha dor de cabeça, todos tomavam Melhoral."
Obstinação por crescer
Apesar da simplicidade, impressiona em Beto Carrero a disposição para o trabalho e a obstinada vontade de crescer. Para o aventureiro, o Beto Carrero World é Disney World do Mercosul.
"Vou ter o segundo maior parque do mundo e o primeiro em originalidade", diz. O Parque Aquático e o Brasil Mágico -em fase de projeto, uma espécie de vitrine da mitologia brasileira- serão inaugurados no ano que vem e ficarão na mesma área do Beto Carrero World.
Família
Beto Carrero prefere não falar de casamento. "Os filhos refletem", diz. São Kelly, 10, Juliana, 12, e Alex, 17, que recentemente foi à Inglaterra para uma primeira viagem de negócios, com mais dois amigos de 17 e 27 anos. "Acreditamos na força jovem. Eles estão vendo empresas das quais queremos comprar o 'know-how de franchising'."
Já havia a idéia de ser Beto Carrero desde a infância. Só aconteceu depois que Sérgio Murad terminou os cursos Normal e de Contabilidade -únicos disponíveis em São José do Rio Preto-, sem nunca ter exercido essas profissões. Sérgio foi ser locutor de rádio, e então nasceu o Beto Carrero.
"Vim para São Paulo aos 18 anos, queria trabalhar na rádio América, mas não tinha emprego. Trabalhei na rádio Globo, na Tupi e na Record e fiquei conhecido do público da TV por meio de um anúncio do Beto Carrero, que vendia o programa de rádio."

Católico, do signo de Virgem, acredita sobretudo na crença. "Tudo aquilo em que você acredita pode se tornar realidade. Eu creio nas coisas possíveis, palpavéis. Veja como a religião ajuda os evangélicos, eles acreditam em Deus, e Deus cuida mesmo deles. Se você não acredita em nada, é um decepcionado da vida. Só fiz um parque porque acreditava naquilo quando ninguém acreditava."
O que os parques da Disney não têm? A Estrada de Ferro, atração recente do Beto Carrero World, que permite uma visão ampla do parque e é cheia de brincadeiras.
O visitante passeia de trem, que corta as vilas e os mundos existentes no parque, como a Vila Esperança, a Vila Rural e o Zoológico.
Em seguida, entra em trecho preservado da Mata Atlântica onde acontecem as atividades. Bandidos atacam o trem, e Beto Carrero -ou seu sósia- vem salvar.
O trem entra na boca de uma enorme serpente, passa pelo mundo dos gigantes e chega à Pré-História, representada por uma exposição de dinossauros gigantes animados. É o máximo.
"Tenho certeza que a Disney vai me comprar os direitos um dia, ou o parque Busch Gardens. Imagine a estrada pronta, a Mata Atlântica com os animais se movimentando, saci-pererê, bumba-meu-boi. Já estamos preparando os bonecos em fibra de vidro."
O parque Magic Kingdom é o preferido de Beto Carrero, além da Disneylândia "que é a original", diz. "É claro que eu tenho simuladores e montanha-russa, mas a gente gosta de ver o fulano cozinhando no fogão de lenha, os computadores estão em qualquer escritório, o pessoal quer ver as cooisas mais antigas."
Negócios
Os shows itinerantes de Beto Carrero acontecem durante o período de baixa temporada do parque do Beto Carrero World.
O empresário fatura em torno de R$ 140 mil com uma sessão na sexta, três no sábado e quatro no domingo, em cada final de semana.
"Enfrento meus projetos como enfrento um tigre ou um leão", conta Beto, que diz aplicar no Beto Carrero World tudo que ganha.
O parque Beto Carrero World já ganha o que gasta, "e um pouco mais", diz Carrero, mas ainda não chegou ao "break even point".
"Não recuperei o investimento feito. Se fosse em São Paulo, a recuperação seria mais rápida. Acredito que vou levar ainda algum tempo. Mas o parque não trabalha no vermelho. Com o Zoológico do parque já cheguei ao 'break even point'."
Para manter-se investindo, Carrero explica que faz os shows e vai atrás de patrocínio para as obras, além de vender merchandising. Empresas como Sadia e Kodak já estão investindo no parque.
A Varig, segundo Carrero, é patrocinadora de uma atração e fornece um número de passagens correspondente a US$ 500 mil por ano.
Desde o ano passado, o parque tem um contrato com a Antártica de US$ 1,5 milhões para cinco anos de patrocínio. Da Arisco, são US$ 2,5 milhões por cinco anos. "Esse dinheiro eu invisto no parque no dia seguinte", diz Beto.
Sócios
Além disso, o artista empresário tem parcerias. "Com a empresa Hering Rasti eu tenho sociedade", diz.
Além de Renato Aragão, é sócio de Gugu Liberato na empresa de propaganda Gugu Produções. "As boas sociedades são meio a meio, com Renato também é assim. O Gugu, hoje, é outro irmão, está todo dia conosco."
As contas que atende na Gugu Produções investem no Beto Carrero World. Arisco, empresas do sul, como Kremer, e Hering Rasti, Marcatto (de chapéus), Monange, Cecrisa (pisos e cerâmicas) são algumas delas.
Patrimônio
Carrero não divulga números ao falar sobre seu patrimônio. Deixa o cálculo das contas referentes a esse patrimônio a cargo dos repórteres que o entrevistam.
"Nunca disse que meu patrimônio era de US$ 150 milhões, como fala a imprensa. Se você for avaliar, não é como o patrimônio de um capitalista, que ele pode vender, nunca vou vender um parque. Para abrir as ações do parque, já me ofereceram US$ 150 milhões."
"O meu negócio é idealismo, não vejo as coisas como comércio", enfatiza.
"Se eu fosse capitalista, eu iria aplicar fora do país, e não investir numa cidade -Penha, a cem quilômetros de Florianópolis, em Santa Catarina- de 6.000 habitantes e cuja população diminuía 5% ao ano.
Não tenho dinheiro em bancos, tenho aquilo que eu ganho e aplico no Beto Carrero World. Se eu arrecadar mais de US$ 100 milhões, vou fazer o Brasil Mágico até o final de 1997, que deverá custar em torno de US$ 170 milhões."
Mas Carrero diz que talvez abra as ações do parque para fazer novos parques. Conta que alguns bancos -Banco do Brasil, Bradesco e Caixa Econômica Federal-, já ofereceram a ele US$ 150 milhões para abrir o capital do parque. "Vou escolher um dos três", diz.

*Mônica Rodrigues Costa viajou a Santa Catarina a convite do parque Beto Carrero World.

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