São Paulo, sexta-feira, 28 de junho de 1996
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A reorganização do interior

LUÍS NASSIF

Na grande guerra dos juros que assolou a economia no ano passado, Birigüi foi uma espécie de Petrogrado paulista.
Grande produtora de calçados, com o câmbio dificultando as exportações e os juros comendo o capital de giro, a cidade foi uma das recordistas de inadimplência do Estado.
Mas, ao lado de outras cidades do interior, tem demonstrado a extraordinária capacidade de adaptação das pequenas e médias empresas brasileiras às mudanças de ambiente.
Em geral, a crise tem levado a uma reorganização setorial, que passa pela montagem de centrais de compra unificadas e estratégias cooperadas de marketing e comercialização.
Essas idéias, óbvias já há algum tempo, não eram implementadas devido à inércia. A crise tem esses aspectos didáticos; apressa reestruturações.
Em Birigi, em meio à crise, empresários com cabeça moderna assumiram o Sindicato da Indústria do Vestuário e deram início a uma programação de guerra. Com a ajuda do Sebrae da região, contrataram a Fundação Cristiano Ottoni, de Minas, para implementar programas de qualidade.
Foi aplicado treinamento intensivo em 84 "facilitadores" -incumbidos de levar os princípios da qualidade a outros 4.000 trabalhadores de 32 empresas associadas ao projeto.
Há dois meses, os empresários locais montaram uma câmara setorial com os fabricantes de calçados de Franca, estudaram os problemas do setor, a parte que lhes competia fazer e encaminharam várias ações conjuntas ao governo do Estado.
O Estado ampliou os prazos para recolher o IPI e os encargos sobre a folha. Os bancos aceitaram renegociar dívidas.
Embora o desemprego ainda esteja alto, voltaram as recontratações. Há 90 dias, a situação tem melhorado lenta e progressivamente.
O moral da cidade está mais elevado do que nunca. Com as ferramentas da qualidade, algumas empresas já falam até em competir com os chineses em seu próprio território -instalar empresas por lá, aproveitando a mão-de-obra barata.
Outras cidades do interior, com produção setorial disseminada, têm percorrido caminhos semelhantes.
No início do ano, a coluna analisou o caso de Jacutinga -cidade na divisa de Minas com São Paulo, com produção de malhas distribuída por mais de cem pequenas empresas.
Mesmo assolada pela crise, a cidade não conseguia romper com a inércia. As empresas competiam entre si e efetuavam as compras individualmente, assim como a comercialização dos produtos.
Antigamente, quando os negócios melhoravam, os empresários se mostravam mais interessados em adquirir carros do ano do que em investir nos próprios negócios.
Para qualquer observador de fora, estava claro que o caminho natural seria os produtores reunirem-se em uma holding, ou associação, que coordenasse compras e vendas.
Essa holding se incumbiria de centralizar o sistema de compras, investir em pesquisas sobre as modas do ano e definir as estratégias de comercialização. Depois, distribuiria os pedidos pelas empresas -cada qual agindo como uma divisão de uma empresa maior.
De lá para cá, o panorama interno mudou substancialmente. Os fabricantes inauguraram uma central de compras. Depois, juntaram-se a outros dois produtores de malhas da região -Águas de Lindóia e Monte Sião- para articular estratégia única de promoção.
Segundo produtores locais, as empresas não estão dando conta dos pedidos. E melhor: mesmo com o dinheiro entrando novamente, ninguém falou em trocar o carro. Todos estão empenhados em investir nos próprios negócios.
Processo semelhante está ocorrendo com a indústria de móveis de Votuporanga. O setor tem se organizado regionalmente com empresas de Rio Preto e buscado soluções locais.

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