São Paulo, segunda-feira, 1 de julho de 1996
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Namorada queria tornar PC evangélico

GABRIELA WOLTHERS; JUCA VARELLA
ENVIADA ESPECIAL A BATALHA (AL)

Cláudia Dantas, filha de político alagoano, afirma que, na data da morte, passou a noite em vigília

Cláudia Dantas, a outra namorada de Paulo César Farias, estava convicta de que poderia converter o ex-tesoureiro da campanha de Fernando Collor em um religioso e torná-lo evangélico.
Ela afirmou que nunca se importou com as centenas de inquéritos com acusações de corrupção que envolviam o nome de PC.
O assassinato do empresário, no último dia 23, acabou com seus planos e fez com que Cláudia trocasse seus objetivos.
Uma de suas principais preocupações no momento é não se tornar mais uma "viúva-sem-aliança".
"Não quero ter minha imagem ligada a outras pessoas, como Adriane Galisteu ("viúva" do piloto Ayrton Senna) e Valéria Zoppello ("viúva" do cantor Dinho, dos Mamonas Assassinas)", disse Cláudia à Folha.
"Queria ganhar a alma dele para Jesus para que tivesse certeza da salvação"
Pode até ser que mude de idéia, mas até agora ela está seguindo sua nova convicção. Somente após 20 horas de plantão em frente à casa de sua mãe, Marlúcia Dantas, em Batalha -cidade a 180 km de Maceió- foi que a Folha conseguiu fotografá-la.
Vigília espiritual
Cláudia, católica de nascimento, se tornou evangélica da Igreja Tabernáculo do Deus Vivo há cerca de seis meses. "Pedia respostas que não conseguia ter no catolicismo", explicou.
Ela contou que, a cada 15 dias, passa a noite em "vigília" na igreja em Maceió. Chega por volta da meia-noite e só sai quando o dia amanhece.
É o que ela afirma ter feito durante a madrugada do dia 22 para o dia 23, quando PC foi morto em sua casa de praia, em Guaxuma. "Saí por volta das 4h da manhã de domingo e dormi na casa de minha amiga Soraia Amaral. Por volta das 8h, fui para Batalha", disse.
Segundo ela, tomou conhecimento do assassinato do namorado pela TV. "Mamãe, foi por isso que ele não me ligou até uma hora dessas", foi sua primeira afirmação ao saber que PC estava morto. Depois, chorou.
PC e Cláudia se falaram pela última vez no sábado, por volta das 17h15. Ela relatou que, neste telefonema, o empresário disse que daria "um ultimato" a Suzana Marcolino. "Hoje eu acabo tudo", teriam sido as palavras do ex-tesoureiro.
Quatro encontros
Cláudia conta que já conhecia PC de vista -"Maceió é muito pequena"-, mas a apresentação formal dos dois aconteceu em 10 de maio, durante um jantar na casa de seu tio, o deputado federal licenciado Luiz Dantas, hoje secretário de Saneamento e Energia do Estado de Alagoas.
No total, foram quatro encontros. Como ele não podia frequentar lugares públicos por estar cumprindo pena em liberdade condicional por falsidade ideológica, três dos encontros aconteceram na casa do empresário no bairro de Mangabeiras, em Maceió.
O último foi em 19 de junho, quatro dias antes da morte de PC, na mesma casa de praia onde foram encontrados os corpos do empresário e de Suzana, a rival.
Mas Suzana não preocupava Cláudia. Segundo ela, PC teria dito, já no primeiro jantar, que tinha outro relacionamento, que queria terminá-lo, mas de uma maneira lenta, sem "traumas".
Cláudia afirmou ainda que PC deixou claro que Suzana não era "uma pessoa para se casar", pois não transmitiria "paz nem tranquilidade" para ele. Segundo Cláudia, o empresário chegou a dizer que Suzana era muito ciumenta, "a ponto de ser agressiva".
"Paulo disse que queria iniciar uma nova fase na vida dele e que eu fazia parte dessa nova fase", disse.
Cláudia se recusou a tecer comentários sobre Suzana. Somente uma vez, quando foi citado o encontro da rival com o dentista Fernando Colleoni na sexta-feira anterior ao crime, deixou escapar: "Ela não teve o mínimo respeito, dignidade pela pessoa humana de Paulo".
Paixão política
A filiação de Cláudia mostra que PC não só era interessado pela política como gostava de misturar política com paixão. A mãe dela, Marlúcia Dantas, é a atual prefeita de Batalha.
Mas quem comanda mesmo a cidade, de cerca de 13 mil habitantes, é seu pai, o fazendeiro José Miguel Dantas, 54. Já foi prefeito do município duas vezes e não pretende se afastar da política tão cedo -no último sábado, lançou-se novamente candidato pelo PSD para as eleições de outubro deste ano.
Nos dois dias (sábado e domingo) em que a Folha esteve em Batalha, toda vez que perguntava sobre o fazendeiro, ouvia a mesma resposta: "Cuidado que ele é bravo".
A Folha encontrou Dantas na convenção que o lançou candidato, no sábado, em Batalha. Vestindo uma camisa xadrez e calça jeans, mostrou-se solícito durante toda a conversa.
Disse que só soube do relacionamento de sua filha com PC após a morte do empresário.
E que não gostaria de tecer comentários sobre o assunto. "Cláudia é uma mulher adulta, separada e tem o direito de se relacionar com quem bem entender, isso é um assunto que só ela pode tratar", afirmou.
Em vez da falar da filha, preferiu apresentar um por um os políticos presentes. "Esse é prefeito de Delmiro Gouveia, esse é vereador em Jaramataia, esse é vereador aqui de Batalha...".
Rei do gado
Os pais de Cláudia, Dantas e Marlúcia, estão divorciados -no casamento, não na política. Marlúcia é a prefeita, mas José Miguel é o "secretário-geral" da prefeitura.
Ele também é um dos fazendeiros mais ricos da região, considerada a bacia leiteira de Alagoas.
"Zé Miguel é o rei do gado daqui", disse Luciano Pereira de Melo, presidente do PSB municipal e adversário político de Dantas, numa referência à novela "O Rei do Gado", da Rede Globo.
A casa de Marlúcia em Batalha é a maior da cidade. Cercada por um muro de três metros, a residência ocupa um terreno de cerca de 2.500 metros quadrados -um contraste com as pequenas casas que a rodeiam.
Segundo Cláudia, o fato de ser herdeira desse patrimônio era um alívio para PC. "Um dia ele me disse que queria ter uma mulher que o amasse, não que amasse seu dinheiro", afirmou.

Colaborou JUCA VARELLA, enviado especial a Batalha

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