São Paulo, terça-feira, 2 de julho de 1996
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Mulheres injetam raiva no rock

PATRICIA DECIA
DE NOVA YORK

Uma nova geração de mulheres virou "rockstar" e está subindo nas paradas de sucesso norte-americanas. Elas são chamadas de "angry white females" (mulheres, brancas e raivosas) e são consideradas as responsáveis pelo nascimento de um novo tipo de feminismo por jornalistas e escritoras norte-americanas.
A tese está em pelo menos dois livros lançados recentemente: "Angry Women in Rock" (Mulheres Raivosas no Rock), de Andrea Juno, e "Rock She Wrote" (Rock que Ela Escreveu), da editora de música do "Village Voice", Evelyn McDonell. Além disso, ganhou a capa da revista "New York", com o artigo de Kim France intitulado "Feminism Rocks".
Bandas de garotas não são exatamente uma coisa nova -vide o movimento das Riot Grrrls, do início dos anos 90 (leia texto ao lado).
Mas, antes de estarem engajadas em qualquer coisa -seja pró-aborto, contra o estupro ou anti-sexismo-, o grande trunfo das novas rockstars é mudar o modelo reservado à mulher no rock.
Elas não são românticas ou boazinhas, mas sim estão preocupadas com sua satisfação sexual. Tudo bem que Madonna já falou abertamente sobre sexo no universo pop, mas nunca empunhou uma guitarra, nem fez rock raivoso, pessoal e descompromissado sem perder a identidade. Isso, segundo as escritoras, era um privilégio masculino até agora.
"Na verdade, essas mulheres se concederam a oportunidade de ser más e ter pensamentos considerados 'sujos', sem culpa ou perda da feminilidade", afirmou Andrea Juno à Folha.
Em resumo, elas são os ídolos de garotas adolescentes que, em vez de subirem nos ombros dos namorados, resolveram entrar de cabeça no "mosh pit" durante os shows.
Tori Amos só toca seu piano com as pernas provocantemente abertas, na direção da platéia. Liz Phair fala explícita e pornograficamente sobre sexo. Justine Frischmann, da banda Elastica, culpa seu namorado por não querer transar quando ela está com vontade, e assim por diante.
A última a entrar nessa categoria é Tracy Bonham, que canta, em "Mother Mother": "Estou faminta/ Estou suja/ Estou enlouquecendo/ Está tudo ótimo".
A grande visibilidade dessa nova geração ocorreu com o sucesso de Alanis Morissette, uma canadense que apresentava programas infantis e foi parar no topo da parada da "Billboard" depois do lançamento de "You Oughta Know".
Morissette, que arrebatou uma porção de prêmios Grammy, é considerada por parte da crítica a resposta palatável da indústria de disco a esse movimento.
A outra representante mais famosa, Courtney Love, também é motivo de muita controvérsia, envolvida em fofocas e chamada de "Yoko Ono do rock alternativo".
Juno acha que Love é a antítese de todo esse feminismo. "Ela simplesmente reproduz a atitude do homem rockstar tipo Mick Jagger e Steve Tyler (Aerosmith). Não há nada menos feminista", diz ela.
Em seu livro, Juno coloca exemplos bem mais radicais e obscuros, como a banda punk de lésbicas Tribe 8. A vocalista Lynn Breedlove só toca sem camisa e usa um pênis de borracha durante os shows. Em certa altura do espetáculo, o acessório é devidamente destruído no que a banda chama de momento de catarse.
"São mulheres que se sentem livres. Elas já encontraram as portas meio abertas e resolveram escancará-las. E se sentem à vontade para fazer isso aos chutes."

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