São Paulo, sábado, 20 de julho de 1996
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Hoje é o primeiro dia de uma nova era

MATINAS SUZUKI JR.
EDITOR-EXECUTIVO

Meus amigos, meus inimigos, sem ser um especialista no assunto, desconfio que, ao soar do primeiro apito, a Olimpíada que começa hoje, em Atlanta (o futebol está em outros locais), EUA, marcará o início de uma nova era no esporte.
Não que esta nova era não esteja já, em toda a sua potencialidade, sendo praticada na quase totalidade de modos de competição esportiva que comp-em esses Jogos centenários.
O fato de ser uma nova era também não significa que será uma era melhor (ou pior) para o esporte. Simplesmente será uma era adaptada ao espírito (ou à ausência de) de uma época (e que época!).
Em primeiro lugar, países bons de medalha como China e Cuba vivem, segundo indica a conjuntura mundial, dias de transição para uma outra forma de regimes político e econômico.
São, vamos dizer assim, os últimos estertores olímpicos do comunismo oficial, que, nos erros e acertos, acabou legando uma imensa contribuição ao esporte no século que apagou suas luzes enfraquecendo bastante o ideário socialista.
Sem o confronto dos dois blocos -e a tensão política que gerava-, os Jogos Olímpicos perdem muito do seu charme. E, em certo sentido, muito da sua competitividade.
Sem os blocos ideológicos, haverá uma dispersão de medalhas. Uma fragmentação maior de bandeira de países diferentes sendo hasteadas, de nacionalidades se revezando nos degraus do pódio.
Assim como haverá uma fragmentação cada vez maior de modalidades -acompanhando a fragmentação geral da vida que é característica deste período tardio do capitalismo que atravessamos.
A cada Olimpíada, aumenta a modalidade de esportes incluídos na competição oficial. Caso do vôlei de praia, por exemplo, aliás, muito bem-vindo para os nordestinos brasileiros que são bambas de renome mundial neste esporte praieiro.
Não custa nada, e teremos, ali pela segunda década do terceiro milênio, uma disputa pela medalha de ouro de jogo de palitinho ou de bolinha de gude (ou de truco).
Cada vez mais o interesse das pessoas é disperso, e essa dispersão gera também um interesse cada vez maior por modalidades esportivas específicas (se você tem TV por assinatura, sabe bem do que estou falando porque já viu um montão de modalidade esportiva sem nenhum interesse geral sendo exibido, incluindo aí esses horríveis "Extreme Games").
Penso que um excesso de modalidades sendo disputado em Olimpíadas se, por um lado, aumenta o número de participantes, tornando o evento cada vez maior, por outro lado, diminui o interesse geral, dado o número massacrante de informações que o grande volume de competições gera.
A oferta excessiva de competições corre o risco de acarretar um certo tédio, um certo desencorajamento de acompanhar a Olimpíada.
(Por outro lado, penso que, quanto mais fragmentação no esporte, maior será o interesse pelos grandes esportes coletivos, como o futebol, por exemplo).
Mas mais marcante do que todas essas mudanças será a mudança imposta pelo mercado: o chamado espírito olímpico, que era a bandeira do esporte amador, será cada vez mais substituído pelo profissionalismo e pela ética do patrocínio.
As modalidades que permanecerem com capacidade de atrair recursos da publicidade e do marketing das empresas ocuparão espaço de relevância. As outras estarão no corredor da cadeira elétrica, uma vez que a tendência internacional de combate aos gastos de Estado também atingirá o esporte.

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