São Paulo, segunda-feira, 22 de julho de 1996
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SE A MODA PEGA...

O aumento de 150% no número de civis mortos mensalmente pela Polícia Militar do Rio de Janeiro depois que foi introduzida a gratificação a policiais por "atuação destacada" indica quão trágicas podem ser as consequências de medidas mal concebidas. Por mais que o combate ao crime nas grandes cidades seja difícil e complexo, o fato é que a noção de "produtividade" em ações que envolvem violência engendra, por razões óbvias, dramáticas distorções.
Com salários sabidamente baixos para o risco e a tensão a que estão submetidos no exercício de seu trabalho, tais recompensas em dinheiro -de 50% a 100% do salário- podem induzir policiais a simular ações violentas ou até mesmo, o que é muito pior, realizar de fato tais ações desnecessariamente.
A afastamento de um tenente-coronel, há três meses, por suspeita de ter forjado a libertação de uma pessoa sequestrada, quando em verdade esta teria fugido por conta própria, é um indício de que a simulação pode estar ocorrendo. O forte aumento do números de mortos por policiais, baseado em dados da própria Secretaria de Segurança Pública do Rio, deixa a dúvida sobre a possibilidade ainda mais grave de que a polícia esteja matando mais para receber as recompensas por "bravura".
Em tese, não se deveria descartar a eventual possibilidade de que o maior número de mortes decorresse de atuação mais dedicada da PM. Ainda assim, para confirmar tal hipótese, seria preciso que se constatassem uma redução expressiva também nos índices criminais, uma drástica queda em assaltos, assassinatos, sequestros etc. E tal mudança, se ocorreu, está por ser apresentada.
Por enquanto, os dados disponíveis sugerem o pior. Permitem supor que de fato a polícia estaria matando mais para receber gratificações. A antiga declaração do secretário Nilton Cerqueira de que a polícia "deve atirar primeiro" não contribui para desfazer a hipótese de que a PM esteja agindo com mais violência que o necessário -algo que, aliás, não é exclusividade do Rio de Janeiro.

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