São Paulo, quarta-feira, 24 de julho de 1996
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DO OURO À FOSSA

DO OURO À FOSSA

A Olimpíada de Atlanta está oferecendo mais uma oportunidade para que o brasileiro exerça sua invencível capacidade de passar em instantes da fossa à euforia e vice-versa, como dizia Nelson Rodrigues.
Antes que fosse acesa a pira olímpica, havia uma disseminada sensação de que o Brasil caminhava para colecionar uma medalha de ouro atrás da outra. Quatro dias e algumas derrotas inesperadas depois, a sensação que percorre salas de visita e conversas de botequim é a de que o país marcha inexoravelmente para um estrepitoso fracasso, ressalvadas apenas algumas exceções devidas ao brilho pessoal de certos atletas, como o nadador Gustavo Borges e o judoca Aurélio Miguel.
A transmutação dos humores nacionais ficou ainda mais nítida no caso do futebol. Antes de o Japão perpetrar a proeza de derrotar a seleção de Zagallo, o técnico havia angariado a aura de novo gênio da raça. Ganhou até uma biografia cujo título diz tudo: "Zagallo, um vencedor".
Bastou um certo Ito marcar o solitário gol japonês para que, de vencedor, Zagallo passasse a "burro", grito sapecado por um torcedor, no segundo tempo do jogo.
Vale tentar pôr uma pitada de racionalidade nessa ciclotimia. Medalhas olímpicas não caem do céu. São, em sua grande maioria, produto da massificação do esporte em cada país, com investimentos maciços do setor privado (já que o setor público está semifalido), e de longa maturação. Somente em alguns casos podem ser o fruto de talentos excepcionais que surgem em diferentes países, como os fundistas etíopes ou os Gustavos Borges e Aurélios Miguel.
Vale lembrar, por fim, que grande parte da graça do esporte, chame-se ele futebol, vôlei ou judô, está no imprevisto, nas chances de que um anônimo Ito supere o time de um Bebeto, ou de que o time de vôlei feminino do Brasil derrote por três a zero as campeãs e favoritas cubanas.

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