São Paulo, quinta-feira, 25 de julho de 1996 |
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Números, números, números ...
LUÍS NASSIF Durante anos, sustentou-se que o nível de desperdício na construção civil brasileiro era de 30%. Levaram-se anos para que alguma alma exigente resolvesse investigar a origem dos números, e descobrisse que não tinham a menor consistência.Daí a importância de não se aceitar números, sem que sejam apresentadas as premissas que levaram ao resultado apresentado. Tome-se o seguinte exemplo: Denúncia - Há fraudes de US$ 2 bilhões no Sistema Único de Saúde (SUS), por conta do pagamento duplo a hospitais que recebem do SUS e de seguros saúde pelo mesmo atendimento. Autores - Fontes não-identificadas e não-qualificadas do Ministério da Saúde. Informações adicionais - No primeiro trimestre o SUS pagou R$ 1,575 bilhão ao SUS. Desse total, 29% foram para hospitais privados, 33% para hospitais públicos, 21% para hospitais filantrópicos e 17% para hospitais universitários. A partir desses números, vamos checar a consistência daqueles R$ 2 bilhões. Passo 1 - Com base nas liberações de R$ 1,575 bilhão no primeiro trimestre, chega-se a uma estimativa de R$ 6,3 bilhões de pagamento no ano. Passo 2 - Para se identificar as fatias do SUS suscetíveis dessas fraudes, deve-se descontar desse valor o montante destinado a hospitais públicos e universitários -que não atendem a clientes de seguro saúde. Sobram os hospitais privados e filantrópicos. Mas nem todos eles atendem a seguro saúde -já que a população segurada é seletiva na escolha dos hospitais. Suponha-se, por exagero, que 80% dos hospitais privados conveniados e 50% dos filantrópicos atendam também a clientes de seguros saúde. Significa que a verba suscetível de fraude é da ordem de R$ 2,1 bilhão/ano. Como a denúncia fala em fraudes anuais da ordem de R$ 2 bilhões, significaria que, 94% de todas as verbas destinadas a esses hospitais estariam sendo fraudadas. Ou seja, de cada dez clientes desses hospitais, 9,5 seriam associados a algum plano de saúde. E em todos esses casos ocorreriam fraudes. Se fosse verdade, todas as demais fraudes do SUS corresponderiam a apenas 6%. Fraudes de 20% ou 30% já seriam gigantescas. Mas nem o mais duro crítico do SUS chegaria a esse número de 94%. Números 2 Dentro do modelo de terceirização da economia, há um papel fundamental para pequenas e microempresas. Começa-se a votar o Estatuto da Micro. Imediatamente, são divulgados dados da Receita sustentando que o Estatuto significará perdas de R$ 4,5 bilhões na arrecadação. Nenhuma fonte oficial, nenhum estudo, nenhuma premissa fundamentando o número. Mas virou verdade absoluta. Paranapanema De novembro a março deste ano, a Secretaria dos Transportes do Paraná viveu situação curiosa. A construtora Paranapanema -uma das maiores do país- passou todo esse período sem ir ao guichê da Secretaria receber os pagamentos a que tinha direito. A Secretaria procurou apurar as razões dessa distração. Descobriu que em novembro a Previ (fundo de pensão do Banco do Brasil) havia adquirido o controle da Paranapanema, e não sabia que, além da mineração, tinha levado junto uma das maiores empreiteiras brasileiras. Texto Anterior: Governo argentino vai demitir 4.400 Próximo Texto: BNDES suspende dívida de R$ 20 milhões da Inpacel Índice |
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