São Paulo, quinta-feira, 25 de julho de 1996
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"Não se entediar é quase uma ocupação em tempo integral"

DO "LIBÉRATION"

A história dos Sex Pistols deslanchou em 1975, em King's Road, com o encontro do empresário Malcolm McLaren, do baterista Paul Cook e do guitarrista Steve Jones com um sujeito de cabelos verdes chamado John Lydon.
Três meses mais tarde, rebatizado de Johnny Rotten (podre), Lydon já era o cantor de um grupo que iria revolucionar o mundo do rock em estágio avançado de embrutecimento disco-FM.
Em outubro de 1976 assinaram contrato com a EMI, a gravadora dos Beatles, que em janeiro de 1977 rescindiu o contrato; graves desentendimentos entre Johnny Rotten e Glen Matlock provocaram a saída deste e sua substituição por Sid Vicious.
Assinaram contrato com a A&M, que dá para trás seis dias mais tarde, destruindo seus exemplares de "God Save the Queen"; morte de Sid Vicious, dominado por seu personagem de punk terminal.
Até dezembro de 1995 as propostas de retomada lucrativa do grupo sempre foram rejeitadas com desprezo pelo sarcástico, irredutível Rotten-Lydon.
Mas desta vez não há dúvida: os Sex Pistols estão de volta. John Lydon expurgou suas recordações amargas escrevendo sua autobiografia "No Irish, No Blacks, No Dogs" e o grupo está de volta para reclamar o que é seu de direito.
*
Pergunta - Como foram os ensaios?
John Lydon - Bem. Estamos nos entendendo tão bem quanto antes -na verdade, melhor. E continuamos ótimos. Quem dizia antigamente que éramos incapazes de tocar duas notas afinadas vai continuar dizendo a mesma coisa.
Pergunta - Vocês sofreram por serem considerados músicos medíocres?
Lydon - Nunca. Diziam que não tínhamos talento porque não nos enquadrávamos em nenhuma categoria. Nem hard rock, nem pop, nem glam-rock, nem disco. Foi a maneira que a indústria (dos discos) encontrou de punir a originalidade.
Pergunta - Então hoje vocês estão partindo para a revanche?
Lydon - Sim. Na turnê todo mundo trabalha para nós, não o inverso.
Pergunta - Vocês não têm nenhuma lembrança boa daquela época?
Glen Matlock - Sempre achei que não estávamos lá para brincadeira. Tínhamos uma missão: agitar as coisas. Era um trabalho duro do qual a diversão não fazia parte.
Lydon - Éramos sérios e reflexivos. Não era e não é uma brincadeira. Eu atribuo muita importância ao meu trabalho, e nossas mensagens sempre são válidas.
Pergunta - Qual sua visão dos grupos do punk americano?
Lydon - São risíveis. Eles têm roupas legais, mas a coisa pára por aí. São totalmente destituídos de conteúdo e de objetivo, exceto o objetivo de terem um ar punk... Não tem nada a ver, porque nenhum de nós tinha esse ar; os iroqueses chegaram depois. Eles não compreendem o efeito dramático. Pergunta - A palavra "punk" evoca o que, para você?
Lydon - Um clichê. Nunca nos consideramos um grupo punk; esse foi um rótulo que um jornalista colou em nós. Dizer que sou punk equivaleria a dizer que não sou original.
Pergunta - O que vocês estão prevendo encontrar nos shows?
Lydon - Algumas pessoas ficarão furiosas, mas serão uma minoria. A maioria das pessoas ficará contente, e são essas pessoas que contam. Que não pensem que estou senil só porque estou com 40 anos. Não quero criticar Pete Townshend, que é amigo meu, mas ele é autor daquela frase "Espero morrer antes de ficar velho", uma declaração ridícula.
Pergunta - Como você avalia estes últimos 20 anos?
Lydon - Espero ter mudado bastante. Senão isso significaria que sou estúpido e incapaz de aprender, de progredir. Mas isso não quer dizer que eu não sinta as coisas da mesma maneira, apenas que outros sentimentos se somaram aos anteriores.
Pergunta - Por que você mora em Los Angeles?
Lydon - Primeiro fui a Nova York porque eu não aguentava mais ser molestado pela polícia na Inglaterra. Depois optei por L.A. porque é o lugar mais maluco do mundo. Esta cidade não tem começo, nem meio, nem fim. A gente tem que fazer um esforço enorme para não se entediar. É quase uma ocupação em tempo integral.

Tradução de Clara Allain

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